terça-feira, 4 de dezembro de 2007

Movimento metodista confessante busca o ecumenismo e defende o dissenso



RIO DE JANEIRO, Brasil, Dezembro 4, 2007

A decisão conciliar da Igreja Metodista de auto-exclusão dos organismos que tenham a presença da Igreja Católica motivou o surgimento do movimento de metodistas confessantes, que tem, entre outros, o propósito de testemunhar “em tempos de obscurantismo e autoritarismo”, e recuperar o dissenso na experiência e a unidade na vida comunitária.

O movimento toma o nome emprestado da Igreja Confessante da Alemanha nazista, daquela parcela da Igreja Evangélica alemã que não se dobrou ao Terceiro Reich, explica em artigo no blog “medotistaconfessante” o professor e jornalista Jaider Batista da Silva, que soma-se à iniciativa “a partir do protestantismo liberal, promotor da razão e da crítica”.

Batista da Silva se diz preocupado com a idéia do episcopado vitalício que “há muito ronda nossos concílios”. Ele frisa que para os metodistas a ordem é presbiterial e o episcopado “deve ser o humilde exercício extraordinário do presbiteriato”. O episcopado, argumenta, é condição temporária e especial “e a depender da continuidade dos abusos, pode vir a ser tomado como excrescência, superfluidade”.

Entre confessantes, define, “devemos defender o princípio bíblico e doutrinário do sacerdócio universal de todos/as os/as crentes, como antídoto ao culto à personalidade promovido por pastores/as e bispos que se comportam como gurus, reduzem a participação leiga à obediência cega e submetem comunidades inteiras ao abuso espiritual. Deve ser antídoto também para a tentação ao governo episcopal despótico”.

Cristãos que são sal e luz do mundo defendem os Direitos Humanos, procuram ampliar a participação das mulheres na igreja e fora dela e seguem “o único ponto de consenso da Igreja no seu primeiro concílio”, o de Jerusalém: não se esquecer dos pobres.

O diretor do Centro Universitário Bennett, do Rio de Janeiro, defende o ecumenismo como “afirmação da recusa das religiões de continuar a espalhar o ódio” num mundo em que o mapa das guerras e conflitos armados aponta as religiões organizadas como o maior fator de ira entre os povos. O ecumenismo, assinala Jaider, é o espaço, também conflitivo, de afirmação e busca da paz.

Nas comunidades locais, preconiza o professor, é preciso anunciar, na fidelidade a Jesus, que aquele ou aquela que as procurar não será lançado fora, “em vez de seguirmos, sem compaixão, orientações episcopais desamorosas e vexatórias para segregarmos maçons e nos posicionarmos contra o projeto de lei que torna crime a homofobia”.

Jaider defende, ainda, as instituições metodistas de ensino, do terceiro grau aos colégios, capazes de exercer influência social. “Não temos televisão, mas temos a rede de educação que, com todos os problemas, é a mais consolidada, qualificada e influente de todas as igrejas evangélicas do país”, afirma.

A educação, para os metodista, diz, é meio de graça. “Por meio dela Deus age na vida das pessoas e as abençoa, muitas vezes apesar de nós. As instituições metodistas de ensino ajudam nossa igreja a não se comportar como seita, ao estabelecer relação entre elas, minoritária, pequena, ainda meio estrangeira, com a sociedade abrangente”, afirma.

Fonte: http://www.alcnoticias.org/articulo.asp?artCode=7144&lanCode=3

Com que discurso eu vou?

Com que discurso eu vou?
Reflexões sobre a Crise Identificatória do Metodismo Brasileiro

Cleber Lizardo de Assis ‘Kebel’*


Primeiramente, aponto a linha de meditação que pretendo desenvolver: o da reflexão, que etimológicamente refere-se a um exercício de ‘se pensar’, pensar de forma que o produto retorne a si, gerando novos reflexos, idéias e possibilidades.


Procurarei falar do lugar das idéias-gérmen, da reflexão-verbo, reverberadora e geradora de novos ciclos, provocativos, dinâmicos e sem a pretensão da conclusão fechada, unívoca e detentora do saber final.
Nem por isso nego pontos de partidas, pressupostos e um lugar de chegada, mesmo que, ao caminhar esteja em permanente tensão e diante de um a-topos, um sem-lugar definitivo.

Nossa perspectiva ainda será a do pensamento complexo e, portanto, conjuntivo, evitando-se as dicotomias que se excluem mutuamente e as secções antagônicas (por ex, categorias como ‘direita’ ou ‘esquerda’, ‘ortodoxo’ ou ‘progressistas’, ‘secular’ ou ‘sagrado’).
As categorias e os argumentos servirão como instrumentos provisórios, caminhos mínimos para se chegar a algo, conceitos não estanques nem rigidamente seccionados.

O tema da identidade é sempre delicado e complexo de ser abordado: seja na sua dimensão individual ou na coletiva.
Para começar, um problema: que identidade é constituída individualmente, auto-fundada? Sua construção exige interações entre diversos sujeitos, no mínimo dois, tornando-a construto interacional.
Problema dois: identidade não é estanque, produto pronto e acabado, mas um processo dinâmico, minimamente estável e que permite um ‘identificar-se’ um ‘si mesmo’. Logo, mesmo havendo algo de natureza mais fixa (Personalidade? Caráter?), existe uma abertura à reconstrução e à metamorfose, tanto que em psicanálise prefere-se falar em identificação, ou seja um processo dinâmico de incorporação de elementos notadamente relacionais.

Posto esse problema de se pensar a identidade individual, coisa que vimos ser essencialmente social, ficamos diante de algo maior, a identidade grupal, coletiva e institucional.

A chamada ‘identidade metodista’ precisou passar por diversos momentos de identificação ou incorporação, desde os elementos judaicos, gregos e sua transição ao cristianismo, passando pelas mediações católico-romanas, pelo protestantismo nascente e o anglicanismo, do metodismo primero ao metodismo em solo norte-americano até desembocar num solo latino-americano com suas particularidades.

E o processo identificatório do metodismo não encerra aí, porque teríamos que, para além dos elementos estritamente religiosos, analisar outros transversais e em ocorrência concomitante, de dimensões políticas, ideológicas e culturais que envolvem os processos humanos.

Assim posto, como apresentar um produto fechado sob o rótulo ‘metodismo brasileiro’? como aferir o discurso reto e verdadeiro (ortodoxia) diante de possíveis desvios e heresias? Como localizar uma essência mínima nos conteúdos herdados e separá-los dos joios de tantos embates históricos? Árdua tarefa, considerando que o próprio Cristo sinalizou a mesma dificuldade, remetendo a sua resolução a um tempo escatológico.

Como se o problema identificacional fosse pequeno, temos ainda os recortes que cada sujeito, de leigo a clérigo com suas idiossincrasias e incorporações, vão agregando ao discurso e à instituição ‘metodista’.
Alguns corolários: ao se discutir um conceito, deve-se ao mínimo, estabelecer acordos sobre sentidos que o mesmo evoca, delimitar pressupostos e possíveis pontos de chegada, e mais, construções e consensos básicos e mínimamente estáveis para possibilitar o diálogo.
Essa prática de um sujeito ou grupo de definir fechadamente a questão, como por exemplo, o que é ser metodista, quaisquer que sejam os bons fundamentos discursivos, está equivocada.

Do mesmo modo, o movimento de justificar argumentos baseando-se num suposto ‘depósito original e exclusivo’ consiste em erro e perigo ainda maior: daí nasce os fundamentalismo nacionais, políticos, raciais e religiosos.

O fenômeno das crises identificatórias, sejam individuais, grupais e institucionais deve ser analisado para além das categorias religiosas, buscando também as interações e embates sociais, políticos, científicos, ideológicos e simbólicos por que passa a dinâmica desse tempo que se convencionou denominar de pós-modernidade, modernidade tardia e outros títulos.

O que se estuda nas diversas ciências são o descentramento paradimático de antigos referenciais geradores de sentido (as religiões por ex) e mesmo da ciência positiva e exata; uma certa diluição de ordem subjetiva diante da multiplicidade de novas instituições-reservas de sentido como as mídias e novas espiritualidades; um fortalecimento das tecnologias midiáticas em detrimento de permanentes dificuldades comunicacionais; uma busca desenfreada e consumista facilitada por um capitalismo desalmado que conduz à exaustão, a novas crises de sentido e a uma iminente destruição global.

Dentro desse bojo, a crise perpassa desde pequenas comunidades de fé, passando pelas religiões monoteístas e pelos blocos denominacionais históricos que precisam sobreviver diante da pluralidade de referências.

Diante dessa guerra velada, consciente ou inconscientemente, os grupos se aliam a outras instituições religiosas e espiritualidades (daí, a relação imbricada entre pentecostalismo e animismo), a instituições poderosas como as mídias televisivas e musicais (não se sabe onde começa a igreja e termina a empresa) e também a instituições políticas e jurídicas numa das formas mais privilegiadas de garantir a tutela do Estado e o aparato jurídico a favor do próprio discurso (no Brasil, por exemplo, quem ousa dizer que de fato o nosso Estado e o aparato jurídico são laicos?).

As crises identificatórias por que passam as próprias religiões, o próprio cristianismo e mais estritamente as igrejas históricas, incluindo o metodismo, referem-se a uma busca de novas parcerias e alianças institucionais para fortalecer a reserva de sentido que vinham oferecendo e que se encontra escasseado. O Sal cristão vem se tornado insípido, a sua luz sem brilho próprio.

Ao discutir a ‘identidade metodista’, para que não caiamos nos chavões que tudo e nada dizem, não basta reduzir a discussão a que tipos de cânticos e liturgias queremos ou devemos praticar, nem mesmo seguir por uma reflexão isolada sobre o que é ou deve ser o metodismo.
Entendo que algumas pistas seriam ouvir nosso povo com uma auto-estima coletiva desequilibrada diante de grupos que crescem da noite pro dia sem qualquer critério e ética válidos; seria um trabalho efetivamente docente sobre o carisma de ser uma comunidade de fé vocacionada para servir e não ser servida, que dialoga e resiste criticamente, que conduz à maturidade e não à regressão infantilóide; seria defender o Evangelho como única e suficiente reserva de sentido para a humanidade; seria oferecer ao rebanho um pastoreio profético e não de manutenção, mais parecido com o do Mestre e menos com os de líderes e empresários do mercado.

Entendo que a discussão deve buscar como ponto de partida o evento Crístico, sobretudo os princípios propostos pelo Rabi, fundamentos de uma ordem a-temporal e a-tópica chamada de Reino de Deus em torno da qual deve girar nosso processo identificatório, ou como queiram outros, nossa identidade.

Capital das Minas Gerais, 03 de dezembro de 2007.

* Educador, Teólogo e Psicólogo. email: kebelassis@yahoo.com.br

Delincrentes & tristemunhos

Igreja, sim, casa de espetáculo, não"

Deus não é surdo, orem baixo!

Respeitem o sossego dos outros, respeitem a lei.











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domingo, 2 de dezembro de 2007

Movimento ecumênico policêntrico






quarta-feira, de novembro de 2007 / Correio-e: edelbehs@alcnoticias.org

SUÍÇA

Grupo intereclesial procura formar

movimento ecumênico "policêntrico"


GENEBRA, 28 de novembro (CMI/ALC) - O arcebispo metodista Michael Kehinde Stephen, da Nigéria, foi eleito moderador do Comitê Permanente sobre Ecumenismo no século XXI, grupo encarregado de fomentar e dar seguimento a iniciativas em prol da unidade cristã em nível mundial. Stephen foi eleito por consenso pelos 14 membros presentes à primeira reunião do comitê, realizada de 18 a 20 de novembro, em Bossey, cidade próxima a Genebra, Suíça.

O arcebispo Stephen trabalhou nas duas conferências anteriores que conduziram à criação do comitê permanente: a reunião reunida em 2003, em Antelias, Líbano, sobre a “reconfiguração do movimento ecumênico”, e a consulta realizada no final de 2004, em Chavannes-de-Bogis, Suíça, sobre “ecumenismo no século XXI”.

O encontro reuniu líderes cristãos de seis regiões do mundo. O grupo estava integrado por representantes das igrejas ortodoxas, católica, anglicana, protestantes e pentecostais, bem como da juventude cristã, organizações ecumênicas regionais, comunhões mundiais cristãs, conselhos nacionais de igrejas e organismos de socorro e desenvolvimento.

O secretário-geral adjunto do Conselho Mundial de Igrejas (CMI), Georges Lemopoulos, assinalou que o processo conduzido de Antelias a Bossey contou com o respaldo do Conselho, mas não se encontra sob seu controle.

Nos últimos anos, disse Lemopoulos, “avançamos sinceramente a partir da consideração do CMI como o instrumento central e privilegiado do movimento ecumênico até a visão de um movimento policêntrico”.

O CMI procurou novas e renovadas associações com igrejas evangélicas e pentecostais, bem como com a Igreja Católica Romana, num modelo caracterizado por um espírito de reciprocidade e cooperação, por uma prática de compartilhar tarefas e recursos, por uma política comum de evitar a concorrência e a demarcação de setores de influência. O secretário adjunto pediu que este processo seja “um caminho compartilhado” no qual o CMI pretende prestar assistência administrativa, garantindo a coerência e a eficácia.

Membro do Comitê Central do CMI, Robina Winbush reiterou a convicção de que o Conselho não tem nenhum desejo de ser o “centro ou a força controladora” das iniciativas emergentes em favor da unidade em Cristo. “Não se trata de questões de sobrevivência institucional”, afirmou, “mas de procurar uma nova visão do que é possível. Peço a Deus que o futuro das instituições chegue a ser também claro ao longo do caminho”.

O professor da Escola Superior de Teologia (EST), de São Leopoldo, Rudolf von Sinner, assinalou que o termo grego “pistis” pode significar tanto “fé” como “confiança”. Mediante o reconhecimento mútuo da fé num Deus, os cristãos “podem correr o risco de confiar uns nos outros. Isto nos torna vulneráveis, mas é o único modo de construir relações significativas”, disse.

Além da confiança, Sinner destacou a necessidade de estabelecer objetivos “concretos, a partir da cooperação prática até o fortalecimento das reuniões entre as congregações e a participação na luta por um mundo mais justo, mais democrático e pacífico”.

Vários membros do comitê mencionaram o Fórum Cristão Mundial, realizado recentemente em Limuru, Quênia, como exemplo de cristãos pertencentes a uma gama de tradições inusitadamente ampla que descobrem uma base comum para o diálogo e a cooperação.

O comitê permanente apresentou várias recomendações institucionais para a reunião do Comitê Central do CMI, agendada para fevereiro de 2008. Numa delas se propõe que diferentes organizações planejem uma reunião ampliada durante a X Assembléia do CMI, em 2013. Isso permitiria que muitas organizações cristãs pudessem estar reunidas, sentindo-se “em seu próprio lar”, e não “como hóspedes”. Em consonância com este objetivo, o planejamento das sessões administrativas do CMI deveria ser realizado separadamente do planejamento das atividades comuns, incluído o culto.

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Religiões oram pela paz

Diário de Maringá - 02 Dezembro 2007

Religiões oram pela paz e derrubam preconceitos

Por: Marlene Portes
Especial para Jornal o Diário 30/11/07


Com o objetivo de cultivar atitudes de respeito e manter um debate entre as lideranças religiosas, será realizada no próximo dia 10, em Maringá, a IV Noite de Oração pela Paz. O encontro será no Salão Social do Templo Budista e é organizado pelo Grupo de Diálogo Inter-Religioso, que reúne religiões evangélicas, católicas, muçulmanas, budistas, baha'is e afro-brasileira.

Os representantes das várias comunidades religiosas dizem estar satisfeitos por participar do grupo. “Sofremos muito com o preconceito, pois isso nos deixa anulados. Muita gente pensa que o candomblé não é uma religião. Alguns acham que fazemos bruxaria, nos chamam de 'filhos do demônio', de macumbeiros. Isso porque não sabem o que significa isso. Já me perguntaram até se não mato criancinhas”, desabafa Maria de Lourdes Nascimento, conhecida como Mãe Maria, representante da comunidade afro-descendente. Ela conta que quando foi convidada a participar do grupo ficou surpresa, mas feliz. “Acredito que o que vai acabar com isso (o preconceito) se chama amor. Mas não um amor só para si, é um amor para a humanidade.”
Foto: Douglas Marçal
Os líderes de sete diferentes comunidades
religiosas de Maringá anunciaram ontem a realização
da Noite de Oração pela Paz no próximo dia 10.


Embora muitas pessoas resistam quanto a essa aproximação, o pastor Robert Stephen Newnum, representante da comunidade evangélica, entende que ela “é fundamental para o mundo de hoje.” Segundo o pastor, “infelizmente nem todos pensam do mesmo jeito e não percebem a importância desse espírito de aceitação do 'outro'. Temos que continuar buscando o respeito e entender que cada pessoa tem sua maneira de chegar a Deus.”

Para dom Anuar Battisti, arcebispo da Arquidiocese de Maringá, a paz depende de cada um e de pequenos gestos. “O ativismo exagerado é hoje a principal causa da violência. Vamos conseguir a paz no mundo começando pela paz entre nós, pelo relacionamento, pelos pequenos gestos como um aperto de mão, um 'olá como vai'. Substituir a cara triste pela cara de Páscoa, de Natal”, aconselha. Unidos pela paz, os líderes das comunidades religiosas acreditam que, mesmo com as diferenças de culto e crença religiosa, é preciso apoiar as causas em defesa da dignidade humana e unir-se em pról da resolução dos problemas da sociedade. Para o xeique Mohmed Elgasim Abbaker-Al Ruheidy, da comunidade muçulmana, o caminho para a paz se inicia pelo trabalho conjunto “ter conhecimentos das religiões é uma satisfação e uma prova de paz”, ressalta.

O encontro entre as religiões, em Maringá, começou com um diálogo ecumênico, em 2001. Nesse tempo, o grupo ganhou força e, em março de 2007, formou o Grupo de Diálogo Inter-Religioso, que atualmente conta com sete religiões. Os representantes se encontram a cada dois meses e, segundo o coordenador Irivaldo Joaquim de Souza, em breve um representante do judaísmo fará parte do grupo.

Fonte: <http://www.odiariomaringa.com.br/noticia/165095>, aceso em 2.12.2007

quarta-feira, 28 de novembro de 2007

Credo

Credo
Rev. Sergio Arantes Pinto

Creio num Deus único, onipotente, onisciente, onipresente, justo, verdadeiro e amoroso, criador do universo, céus, terra, astros, e tudo o que neles há; Sua essência é sem corpo, infinito, ocupando mais do que toda a sua criação e da qual é pai (Gn. 1 - 2).

Creio num Deus que não faz acepção de pessoas (Dt. 10: 17; Rm. 2: 11); Todos são seus filhos e o seu desejo é que todos aceitem o seu chamado para viverem em fé, cooperação em amor, suportando uns aos outros, como o próprio Deus o faz conosco (Lc. 15: 11 - 32).

Creio num Deus que chamou um homem, Abrão e lhe disse que nele seriam abençoadas todas as famílias da terra (Gn. 12: 1 - 3); Por meio de todas essas famílias abençoadas, a terra e o universo também seriam abençoados e restaurados à condição de “muito bons” (Mt. 28: 18 - 20; Ez. 18: 30 - 32; I Tm. 2: 1 - 6).

Creio em Deus que, em Jesus Cristo, se fez palavra, criou todas as coisas e como Deus Salvador, se encarnou para viver, como humano, o grande amor de Deus, dando a sua própria vida imaculada por todo o mundo, para a redenção de toda a humanidade (Jo. 1: 1 - 5; 10 - 14).

Deus é Espírito Santo, edificador, sustentador e consolador da sua obra em Cristo (Jo. 14: 16 - 28).

O Deus trino vive eternamente, sem princípio nem fim; A ele tudo é sujeito, até o próprio tempo, pois ele o criou (Gn. 21: 33; Is. 9: 6; 26: 4; Mq. 5: 2; Sl. 90: 4; II Pd. 3: 8).

Creio que a Igreja, o novo Israel, não salva, mas é a comunidade que aceita o chamado de Deus para proclamar e viver a sua mensagem de amor e salvação; Comunidade que é santa e pecadora, pois constituída de pecadores arrependidos, que é sempre perdoada e santificada por Deus em Cristo (Mt. 11: 27 - 30; 16: 18; Mc. 16: 14 - 18; Jo. 6: 66 - 69; Gl. 3: 13 - 14; 5: 1 - 6).

Creio que os descendentes de Abraão, segundo a carne, esqueceram-se dessa bênção para a qual foram chamados e que eles não só se esqueceram, mas atolaram-se na desobediência, no pecado e aceitaram deuses falsos durante toda a sua caminhada, com raríssimas exceções. Mas Deus não desistiu do seu intuito de ter filhos à sua imagem e semelhança; Deus é capaz de converter a maldição em bênção; Creio que Deus pode salvar quem quiser, independente de qualquer julgamento humano. (Gn. 50: 20; Ex. 33: 19; Ed. 13: 2; Is. 45: 6 - 7; Lm. 3: 38; Am. 3: 6).

Creio que Deus, na sua pré-ciência, por incapacidade total da humanidade, havia planejado que ele mesmo seria o autor e consumador da fé salvadora do ser humano (I Co. 12: 4 - 7, 11, 18; Cl. 1: 13 - 20; Hb. 2: 5 - 11; 4:14 - 16).

Creio que o homem e a mulher sempre foram, são e serão pecadores e incapacitados de produzir salvação. São seres dependentes, por natureza e, no máximo, podem, como imagem e semelhança de Deus, raciocinar e aceitar, de graça, a salvação. A aceitação da salvação é uma escolha que não faz dele um deus, ser perfeito, nem o capacita a andar como Deus quer que ele viva (II Cr. 6: 36; Ec. 7: 20; Sl. 143: 2; Rm. 3: 10, 23).

Creio que todos os homens e mulheres pecaram e estão destituídos da graça de Deus; Que é necessário, para a salvação, que o ser humano aceite e confesse a sua situação diante de si mesmo, diante de Deus e diante do seu semelhante, na sinceridade do seu coração, para que a graça de Deus se torne eficaz e haja transformação real em sua vida (Lv. 26: 40 - 45; Dn. 9: 4 - 19).

Creio que só a graça de Deus pode capacitar o ser humano para que ele viva a vida completa; Só a graça de Deus pode trabalhar, com a vontade do homem e da mulher, para que eles ajam como seres criados à imagem e semelhança do Criador. Ele quer que todos sejam salvos, mas não impõe seu querer à vontade do homem ou da mulher (Ef. 2: 1 - 16; 4 - 5: 1).

Creio que homens e mulheres não são justificados por obra, pois tudo de mal que fazem só serve para sua condenação e tudo de bem que fazem não passa de sua obrigação, pois para isso foram formados (Lc. 17: 10); Foram criados para a glória de Deus, para serem embaixadores e cooperadores com Deus e com seu semelhante, com a natureza e com todo o universo; Agindo corretamente trabalham a sua felicidade e a do seu próximo; Agindo erradamente trabalham a sua infelicidade e a do seu próximo.

Creio que a Bíblia é inspirada por Deus e foi escrita por homens que receberam a sua revelação, mesmo sem entenderem bem o que Deus lhes estava transmitindo. Por essa razão a Bíblia é sempre nova, dizendo aquilo que é necessário para o viver de cada um e para o viver em comunidade. Ela descreve a vida de povos e em especial a vida do povo de Israel, demonstrando as falhas e as possibilidades humanas. Descreve a história da salvação programada pelo próprio Deus (II Tm. 3: 14 - 17; 4: 1 - 5); I Pd. 4: 11; II Pd. 1: 19 - 21).

Creio que a Bíblia evidencia a forma como a humanidade não deve andar e a forma como deve viver; Ela mostra o amor, a justiça, o poder e a misericórdia de Deus e toda a imperfeição daqueles e daquelas que nunca serão Deus, mas que receberam o direito de serem imagem e semelhança de Deus.

Creio que a Bíblia não pode fazer a humanidade se tornar santa, mas ela sinaliza o caminho, a verdade e a vida; As leis, os exemplos e a história que ela apresenta não modificam a vida da humanidade, mas oferecem a maneira pela qual o ser humano pode aceitar a vida plena em Cristo.

Jesus não condenou as pessoas nem os relacionamentos entre as pessoas por elas serem diferentes ou pensarem de forma diferente. Ele denunciou o erro e mostrou a única forma de se ter vida plena. Procurou estar com todos para possibilitar o viver comum.

A fé que Jesus pregou é includente, pois Deus quer que vivamos como seus filhos, como irmãos. Quer que seja vivida a cooperação e a comunhão e não a concorrência, a massificação ou o individualismo.

Creio que o Deus Trino, Pai, Filho e Espírito Santo, não faz acepção de pessoas, nem de associação de pessoas, nem de órgãos, nem de instituições, nem de povos, nem de raças, nem de governos. Ele quer a redenção de toda a humanidade e de toda a terra; Ele nunca perguntou para saber e, mesmo, sabendo nunca deixou de se relacionar com as diversas seitas, denominações, magistrados, levitas, sacerdotes, saduceus, fariseus, publicanos e reis (Ed. 6: 1 - 12; 7: 11 - 26; Is. 44: 28; 45: 1; Jr. 27: 5 - 7, 19 - 22; 29:7; 43:10) e povos; Seus apóstolos relacionaram-se com reis, governadores, procônsules de quaisquer religiões; Deus não muda.

Jesus não tornou mal por mal, mas ensinou a amar os inimigos (Lc. 6: 27 - 36). Ele teve inimigos, mas não se tornou inimigo de ninguém. Foi capaz de dizer: “Pois quem não é contra nós é por nós” (Mc. 9: 40).

O evangelho de Jesus, que é o meu evangelho, é de paz (Jo. 14: 27; 16: 33). Paz Shalom, capaz de transformar vidas, órgãos, instituições, governos, mesmo dos “incrédulos” e “idólatras”. Ele é poder, que vem do Espírito Santo sobre todos, todas e todas as coisas.

No passado ele foi capaz de agir no império egípcio, assírio-babilônico, grego e romano e, contra tudo e contra todos, transpassando as barreiras da impiedade dos césares, fez a Bíblia e a Igreja vir por toda a terra e chegar até nós.

Deus, em Wesley, foi capaz de se sobrepor à Igreja da Inglaterra e aos responsáveis pelo Estado Anglicano e fazer uma nova Inglaterra. Não por força e nem por violência (Zc. 4: 6), mas simplesmente proclamando e vivendo as boas novas de salvação, tanto humanas como eternas.

Creio que sou Israel, povo escolhido de Deus, Igreja, comunidade daqueles e daquelas que foram chamados e aceitaram viver para testemunharem a boa nova de salvação de todo ser humano e, com este, proclamar a redenção de toda a terra (Rm. 2: 1 - 16; Gl. 3: 6 - 29).

Creio que na Igreja de Cristo não há lugar para descompassos humanos resolverem problemas espirituais. O viver comum submisso a Cristo, mesmo com os erros que toda a humanidade tem, conduz à salvação eterna; Não fomos chamados para julgar os outros, muito menos para cercearmos a liberdade de ninguém. Isto é problema da má política e da injustiça humana.

Creio que o Espírito Santo, que é o Espírito de Deus presente em nós e ao redor de nós, é quem nos conduz, quando deixamos, a toda verdade, quer estejamos ou não associados a instituições humanas de caráter religioso, filosófico, político, científico, educacional, social ou tecnológico.

Creio que no Reino de Deus, que começa com a Igreja de Cristo, os valores têm de ser os de Deus, que sempre deu liberdade aos homens e mulheres para escolherem o seu próprio caminho (Mt. 15: 17 - 18).

Creio que a Igreja zela por um caminho ético, segundo os mandamentos de Deus, mas deixa aos seres humanos escolherem seus caminhos. Não impõe a sua ética, nem aos humanos e nem às suas instituições. Zela pela apresentação da vontade de Deus, mas não cerceia a liberdade de escolha de cada um, nem do todo (Tt. 2: 11 - 15).

Creio que o cristão está aberto ao diálogo com toda a humanidade, quer individualmente, quer comunitariamente, pronto a dar a razão de ser da sua fé, sem tolher a liberdade de escolha de quem quer que seja. Ele está pronto a testemunhar a sua fé e a conseqüente felicidade que Deus lhe concede de entender, aceitar e viver o evangelho de Cristo Jesus. Ele confia que o Espírito Santo age na sua vida e na vida daqueles que estão ao seu redor, inclusive nas instituições, para conversão e salvação; Ele sabe que sozinho nada pode, mas que o Espírito de Deus pode todas as coisas. Por isso ele se coloca humildemente nas mãos do Espírito para que este realize a obra de Deus (Lc. 12: 1 - 12; Tt. 3: 1 - 11).

Por isso sou cristão, metodista e ecumênico.

Juiz de Fora, 31 de agosto de 2006.
Rev. Sergio Arantes Pinto.


segunda-feira, 26 de novembro de 2007

quinta-feira, 22 de novembro de 2007

Adesão ou conversão?

Adesão ou conversão?
Carlos Wesley*

“Não podemos admitir que o nosso crescimento numérico seja constituído de um aglomerado de pessoas, sem conhecimento e preparo bíblico-doutrinário, sem comprometimento com as raízes históricas do metodismo e as posições assumidas historicamente pela Igreja, através de seus concílios e seus documentos, tornando-se um ajuntamento de pessoas que estão na Igreja Metodista mas não vestem a camisa da identidade metodista, afirmando: “Estou na Igreja Metodista” ao invés de dizerem: Sou Metodista”.

Essa é uma afirmação do falecido Bispo David Ponciano Dias, em sua Palavra Episcopal publicada no Expositor Cristão de outubro de 1999 e agora, também, a preocupação do Bispo Paulo Lockmann, de nossa Região, que em seu relatório episcopal ao XXXV Concílio Regional realizado recentemente, afirmou a existência, em nosso meio, de “uma desordem religiosa”, onde “as fronteiras religiosas se confundem e confundem”. Disse ainda o Bispo Lockmann: “Vive-se uma conturbação religiosa, na qual, nós, metodistas, somos visivelmente afetados (as). Dentro desse quadro, as pessoas são, em grande número, levadas por todo o vento de doutrina, agitadas de um lado para outro”.

As afirmativas dessas duas importantes lideranças refletem a angústia de uma parte considerável e respeitável de nossa Igreja Metodista, diante de uma acelerada perda de identidade de nossa denominação face, principalmente, à perturbadora influência dos grupos neo-pentecostais, cada vez mais presente nas igrejas protestantes (caracterizando os grupos históricos das igrejas chamadas evangélicas, estas hoje constituindo um arco bastante heterogêneo de componentes, muitas vezes divergentes entre si), impregnando-as de doutrinas, costumes e práticas que nada têm a haver com elas.

O crescimento numérico dessas novas seitas tem sido invejado em nosso meio, principalmente quando artistas conhecidos e esportistas famosos, para não falar de bandidos notórios, se dizem convertidos e freqüentam alguns desses movimentos, fazendo com que muitos pastores nossos busquem em seus arraiais os modelos do seu ministério pastoral. Afinal de contas, tem contado muito na avaliação do seu trabalho ministerial (não usei a expressão “trabalho pastoral” intencionalmente) o crescimento numérico de sua comunidade, seja ele conseguido a que preço for. Chego a pensar, mesmo, que, nessa questão, muitos têm agido como se os fins justificassem os meios...

Essa reflexão está sendo feita em razão de um artigo publicado na revista Ultimato (setembro/outubro de 2001), intitulado “Monique Evans ainda está longe da terra prometida”. O título pode até soar estranho para alguns, ou mesmo parecer um julgamento pesado, mas não é. O tema desenvolvido ali defende a tese de que “nesta época de euforia e de ênfase à conversão de celebridades e de multidões, a igreja evangélica brasileira precisa redescobrir o significado da palavra “conversão”“. É um texto muito mais elucidativo que condenatório.

O que significa conversão para nós? Eu ainda peguei um tempo onde ser “crente” implicava em muitas perseguições, inclusive na própria família (meu pai foi pastor na década de trinta no interior capixaba e mineiro), além de preconceitos, chacotas, humilhações, entre outras coisas. Dentre tantas histórias da bela carreira pastoral do meu pai, existem algumas de perseguições a pedradas pelas ruas de cidade interioranas. Muitos irmãos antigos de nossas comunidades metodistas podem contar histórias semelhantes que nunca imaginaríamos que pudessem um dia ter acontecido.

Mas, o tempo é outro. A Igreja Evangélica ocupa hoje um lugar de proeminência na sociedade. Seu crescimento vertiginoso chama a atenção da mídia e, conseqüentemente, da população em geral. Para dizer a verdade, ser crente hoje até dá um certo status. Nos bancos, ou nos púlpitos das igrejas, estão assentadas pessoas importantes, astros e estrelas da TV, personalidades do mundo esportivo, músicos do show business e até notórios bandidos que se “converteram”, como aquele bem conhecido ladrão de carros que, depois, foi morto na disputa por uma “boca de fumo” numa favela de nossa cidade... A própria igreja hoje fabrica os seus ícones, sendo que um, dos mais famosos, encontra-se hoje no ostracismo pelos problemas de adultério e de envolvimento com dossiês falsificados. E nesse entorpecimento da fama, gerado pela ação midiática, muitos são atraídos para as fileiras das igrejas. Como foi muito bem colocado pela Ultimato, “é preciso fazer a diferença entre adesão e conversão. Adesão é o ato de abraçar um movimento... Conversão é um acontecimento que imprime novos conceitos e nova vida”.

Conversão, segundo D.G. Bloesch, “é a invasão da graça divina na vida humana, a ressurreição da morte espiritual para a vida eterna”. Quem inicia a obra da conversão é o próprio Deus, nunca o homem. Assim, a conversão só pode ser entendida como uma resposta humana a um chamado divino. Não é o homem quem decide aceitar Jesus como seu Senhor. Ele na verdade está simplesmente respondendo à graça irresistível de Deus.

A conversão possui dois aspectos distintos que precisam ser levados em consideração nesses tempos de tanta confusão. Esses elementos são o arrependimento e a fé. A verdadeira conversão vem atrelada a essa dupla inseparável. Enquanto o arrependimento é o ato de se dar as costas para o pecado, a fé é o ato de se voltar para Cristo. O arrependimento significa a mudança que é produzida na vida daquele que se encontra com Jesus, levando-o ao abandono do pecado. A fé é o ato de se apossar das promessas e da obra de Cristo. Na genuína conversão, um jamais existe sem o outro.

O que temos visto, porém, é muita “conversão” e pouca manifestação de arrependimento e fé. A conversão sem o reflexo desses dois elementos produz um cristianismo espúrio.

O Bispo David, depois da sua afirmação citada no início desta reflexão, complementa: “Desta maneira, o crescimento numérico mais se parece com uma inchação do que com um crescimento saudável que é necessário para o desenvolvimento da ação missionária da igreja”. Valdir Steuernagel, disse que “uma igreja que cresce e que não tem impactos de justiça na sociedade sofre de um crescimento enfermo”.

É, ainda, do Bispo Paulo Lockmann, em seu documento ao povo chamado Metodista da Primeira Região, por ocasião do Concílio Regional, a afirmação de que é vital definir a razão de nossa existência: “É importante deixar claro quem somos e para quê existimos. E tal definição deve ser, acima de tudo, conhecida da comunidade interna. Todos (as) os (as) metodistas precisam saber e memorizar essa lição.”

João Wesley dizia que o povo metodista existe “para transformar a nação, particularmente a Igreja e espalhar a santidade bíblica por toda a terra”. A Igreja Metodista precisa crescer, sim, mas em unidade e com identidade, através de verdadeiras conversões e não de festivas (ou interesseiras) adesões, como a de Constantino e seu exército, para poder causar impacto na sociedade, provocar mudanças e participar do “seu propósito de salvar o mundo”. Digamos todos: AMÉM!

IGREJA METODISTA:
Crescimento em Unidade e com Identidade

METODISTA: Ler ou não Ser
Pela preservação e valorização da Identidade Metodista

quarta-feira, 21 de novembro de 2007

King: obra inacabada

Uma Obra Inacabada
Paulo Ayres Matos


“Quem se importa hoje com Martin Luther King? Quem se interessa hoje por Martin Luther King?”, essa foi a questão colocada há quase duas décadas atrás pelo Don L. Davis, diretor do Instituto de Pastoral Urbano ligado à Universidade da Virgínia, nos Estados Unidos, num excelente ensaio sobre a relevância do pensamento e da obra de Martin Luther King, vinte anos após a sua morte por ocasião do estabelecimento da terceira segunda-feira do mês de janeiro como feriado nacional norte-americano, em celebração do seu aniversário no dia 15 do mesmo mês. O argumento central do ensaio de Davis tem a ver com a dura constatação de que a melhor maneira de nos livrarmos do legado da vida do grande ativista social norte-americano em favor dos direitos civis da população negra tem sido a crescente veneração dele por parte da elite norte-americana, e me atreveria a dizer de todo o mundo, na mesma medida em que os princípios, valores e estratégias que nortearam sua prática revolucionária são negados no cotidiano das relações sociais. Dizia, então, dr. Davis, citando um dos biógrafos de King:

“Os mesmos congresso e presidente que aprovaram o dia do aniversário de Martin King como feriado nacional se recusaram assinar uma nova lei de direitos civis nos anos 80. ... Não seria o caso do Presidente Reagan ter se apercebido de que a melhor maneira de não se confrontar com King é venerá-lo? Honrá-lo com um feriado que se estivesse ele vivo nunca teria aceitado? ... É muito mais fácil honrar um herói morto do que reconhecer e seguir um profeta vivo! A melhor maneira de se furtar a qualquer desafio é exaltar e adorar a fonte concreta da qual se originou tal desafio.”

Quero honrar a memória e a luta de um dos maiores seres humanos que o século XX teve oportunidade de oferecer a todas as gerações – Martin Luther King Jr. Mas o que será que nos trouxe aqui? Será que nos importamos realmente com sua vida e obra? Haverá realmente algum interesse de nossa parte de nos comprometermos, pelo menos de uma vaga maneira, com os mesmos valores e princípios que fizeram dele um ardoroso lutador pela erradicação das injustiças não só em seu país, mas em outros cantos do mundo? O que será que nos motiva na realização dessa III Semana Martin Luther King?

O que me proponho apresentar nesta sessão de abertura dessa importante realização do Palas Athenas é uma reflexão sobre a trajetória de um homem que sempre teve diante de si a certeza de que sua obra era anterior a ele mesmo e que não estaria terminada quando de sua morte. No dia anterior a sua morte, em 3 de abril de 1968, na conclusão do discurso proferido aos grevistas dos serviços de água e esgoto da cidade de Memphis, no Estado de Tennessee, King, alegorizando a passagem bíblica que diz ter Moisés visto de longe, do alto da montanha, a terra prometida onde por sua morte não pode entrar, afirmou:

“O que fariam a mim alguns de nossos doentes irmãos brancos? Bem, eu não sei o que me acontecerá agora. Nós temos diante de nós duros dias. Mas isto não me importa agora. Porque eu tenho estado no alto da montanha. E eu não me importo. Como qualquer um, eu gostaria de viver uma vida longa. Longevidade é coisa boa. Mas eu não estou preocupado com ela agora. A única coisa que quero fazer é cumprir com a vontade de Deus. E Deus me tem permito chegar ao alto da montanha. E eu a tenho contemplado – a terra prometida. Talvez eu não entre nela acompanhando vocês. Mas nesta noite quero que vocês saibam que, como um povo, vamos entrar na terra prometida. E por isto estou feliz esta noite. Eu não temo nada. Nenhum homem me faz ter medo. Meus olhos viram a glória do Senhor.”

Esta profunda convicção de que a obra na qual estava engajado era muito maior do que ele mesmo, fez de Martin Luther King um símbolo para todas as pessoas que lutam pela superação de todas as formas de exclusão e descriminação. A obra de sua curta vida morreu antes de completar quarenta anos de idade, é e sempre será uma referência maior onde quer que seja mulheres e homens estejam comprometidos com a construção de uma sociedade mais justa e fraterna.

Mas quem foi este Martin Luther King? Permitam-me apresentar alguns traços que considero importantes de sua trajetória desde Atlanta, onde nasceu, até seu martírio em Memphis. King nasceu no dia 15 de janeiro de 1929. Como seu pai, tornou-se pastor batista, sendo ordenado quanto tinha somente 19 anos de idade, da época em que também se graduou em sociologia na conceituada faculdade negra Morehouse College. Foi nesta mesma época que King pela primeira vez tomou contato com a vida e obra de Mahatma Ghandi, passando desde então a estudar com seriedade seus ensinos sobre a não-violência como estratégia para radicais mudanças sociais.

Sua carreira acadêmica foi desenvolvida primeiro no Seminário Teológico Crozer, na Pennsylvania, onde se bacharelou em teologia, e posteriormente na Faculdade de Teologia da Universidade de Boston, onde recebeu o título de doutor em filosofia na área de teologia sistemática. Foi em Boston, sob a orientação do teólogo metodista Harold DeWolf, introduzido à filosofia do personalismo, uma escola filosófica norte-americana que afirma o valor fundamental de cada ser humano enquanto tal.

Convicto de que a obra na qual se engajara era maior do que ele mesmo

A formação religiosa de King se deu dentro de um lar e de uma igreja fortemente enraizadas na vibrante tradição evangélica negra norte-americana. Ao longo dos tempos, as igrejas negras, principalmente as batistas e metodistas, vieram a ser espaços de resistência e luta contra o racismo e a segregação racial nos Estados Unidos. Foram elas nutridas na aplicação do ensino bíblico à vida cotidiana sofrida da população afro-americana, tanto antes como depois de sua emancipação, tão bem expressa nos cânticos dos Negro Spirituals. Essa formação religiosa foi fundamental para o desenvolvimento não somente de sua teologia mas acima de tudo para uma forte espiritualidade manifesta de modo particular em sua prática social. King se insere numa tradição religiosa afro-americana extremamente ampla e rica em que resistência e luta pela liberdade se conjugam através da interconexão no imaginário religioso das lembranças da mãe-África com a mensagem na Bíblia do Deus do Êxodo, o libertador dos pobres escravos no Egito. Certamente cânticos como Go down, Moses, tell the Pharoh e War no more! inspiraram gerações e gerações de afro-americanos em sua luta primeiro contra a própria escravidão, e depois contra a descriminação e a segregação raciais.

E isso não foi diferente com Martin Luther King. Neste sentido, a mística e a espiritualidade de King foram sempre caracterizadas pela firme convicção de que o Deus da Bíblia, em meio às lutas de cada dia, sempre está do, no e ao lado dos pobres, dos marginalizados, dos discriminados e dos excluídos da sociedade. Outro aspecto da religiosidade afro-americana que se introjetou profundamente em King foi o estilo oratório peculiar aos pregadores negros norte-americanos. King, quer como pregador, quer como conferencista, quer como ativista social, nunca abriu mão da retórica própria das igrejas negras norte-americanas.

Por outro lado, as pesquisas mais recentes sobre o pensamento de King mostram que sua formação teológica tanto no Crozer como em Boston o levaram a aprofundar sua resistência e crescentemente oposição a qualquer forma intimista ou individualista da fé religiosa. Neste sentido, King assumiu crescentemente a agenda teológica do liberalismo norte-americano, especialmente do Evangelho Social (Social Gospel). A forte piedade e espiritualidade místicas de King, insertadas na cultura religiosa afro-americana, foram cada vez mais ao longo de sua curta existência determinadas por seu crescente e radical compromisso social na luta em favor da justiça e da paz. Os estudiosos que nas últimas duas décadas têm se dedicado ao resgate do pensamento teológico e social de King estão afirmando com mais veemência a importância de sua formação teológica e filosófica em sua prática política, de maneira particular a influência da filosofia da não-violência como ensinada e praticada por Mahatma Ghandi.

Entretanto, em que pese à importância tanto de sua formação religiosa na casa de seus pais e na igreja batista negra, como de sua formação acadêmica no Seminário Crozer e na Universidade de Boston, a verdade é que sua vida vai ter uma mudança radical com a sua designação para o pastorado da Igreja Batista da Avenida Dexter em Montgomery, Alabama, no coração racista do chamado Deep South, a terra da mais abjeta descriminação e segregação raciais. Um ano depois de sua chegada a Montgomery, King não teve como escapar ao desafio colocado pela inusitada e radical decisão de Rosa Parks, uma mulher negra de 42 anos de idade, ao recusar ceder seu lugar a um branco num dos ônibus da cidade. Rosa, recentemente falecida, por causa de seu aparente tresloucado gesto no dia 1o de dezembro de 1955, acendeu a chama de uma fogueira que logo estaria incendiando a vida de milhares e milhares de mulheres e homens negros em todo sul dos Estados Unidos, inclusive de Martin Luther King. Quatro dias depois, simultaneamente ocorreram o boycott contra as companhias de ônibus, o julgamento de Rosa Parks, e a eleição de King por unanimidade para presidente da Associação para o Progresso [de Pessoas de Cor] de Montgomery. Neste mesmo dia aconteceu a virada na vida de King. Naquele dia, King estava virando a página de sua vida de forma irreversível. A tranqüilidade dos tempos escolares, acadêmicos e ministeriais, de êxito pessoal, daria lugar a uma vida tempestuosa de grandes vitórias e terríveis derrotas. Ele e o mundo já não seriam os mesmos. Logo o doutor em teologia teria de dar lugar ao audacioso pastor-ativista. Em menos de dois meses King provou o gosto amargo e ao mesmo tempo desafiador das cadeias de uma sociedade racista. Daí em diante até o final de sua vida King nunca se envergonhou por um minuto passado em um recinto presidiário; antes pelo contrário, pois, em suas próprias palavras, se envergonhava sim da sociedade que construíra cadeias para encerrar aqueles e aquelas que lutavam em favor da justiça e da igualdade entre todas as pessoas, quer fossem elas brancas ou negras. Daí em diante King e seus familiares estiveram sempre correndo risco de morte, sendo alvo de uma série infindável de tentativas de assassinato, de atentados a bomba contra sua casa, de acusações infames contra sua integridade moral, intelectual, política e espiritual, inclusive de plágio de sua tese doutoral e de adultério, sendo que muitas dessas acusações foram forjadas pelos próprios órgãos de segurança do governo norte-americano.

É verdade que a luta em Montgomery contra a segregação nos ônibus acabou por ter êxito sendo eliminada por ato da Suprema Corte Americana qualquer discriminação; um ano depois do ato corajoso de Rosa Parks o sistema de transporte público no Estado de Alabama foi integrado. Mas a luta contra o racismo norte-americano estava somente no início. Muito mais havia por fazer, primeiro no sul dos Estados Unidos, depois no norte do país, e tempos depois além das fronteiras do seu país.

"Como qualquer um, eu gostaria de viver uma longa vida.Mas a única cosa que eu quero é cumprir com a vontade de Deus." King

As complicações no ano de 1958 não foram poucas e culminaram em setembro com o atentado que King sofreu no Harlem, em Nova Iorque. Em plena recuperação, King resolve no início do ano seguinte passar com sua esposa Coretta um mês na Índia se aprofundando nas técnicas das marchas não-violentas de Gandhi, a convite de Jawaharal Nehru, primeiro-ministro daquele país. No início de 1960, outro fato importante vai catapultar as atividades de King: sua transferência para Atlanta a fim de assumir com seu pai o co-pastorado da histórica Igreja Batista Ebenezer. Os anos seguintes vêem King cada vez mais articular politicamente a luta contra o racismo, tanto local como nacionalmente. Demonstrações sit-in, marchas, piquetes, vigílias de oração, tudo isto é motivo para prisões, julgamentos, e atentados, não só contra King, mas contra outros ativistas dos direitos civis, inclusive com o assassinato de Medgar Evers, líder do Naacp no Mississipi. Por outro lado, foram se criando as condições para maior mobilização e organização em níveis local, regional e nacional do movimento dos direitos civis de tal sorte que no verão de 1963 foi possível organizar-se a primeira grande demonstração em escala nacional que se realizou no dia 28 de agosto quando King proferiu seu célebre discurso “I have a Dream”. Nessa ocasião King e outros líderes do movimento se encontram uma vez mais com o presidente norte-americano John Kennedy. Os meses seguintes foram de dramáticos acontecimentos: em setembro quatro meninas negras são mortas num atentado à bomba a uma igreja negra na cidade de Birmingham, Alabama, e em novembro o Presidente Kennedy é assassinado. O ano de 1964 vê King envolvido em diversos protestos por todo o sul dos Estados Unidos, a morte por assassinato de dois estudantes brancos e um negro que estavam fazendo campanha para inscrição eleitoral de negros no Mississipi, a assinatura da primeira parte da Lei dos Direitos Civis, e a concessão do Prêmio Nobel da Paz a King.

No início de 1965 Malcom X, ex-líder do movimento muçulmano negro, é assassinado por antigos companheiros muçulmanos. King, apesar de suas profundas divergências ideológicas com Malcolm, devido à questão do uso estratégico da não-violência, expressa seu profundo pesar pela morte do outro líder negro norte-americano mais importante naquela década. Neste mesmo ano a cidade de Selma, no Alabama, vai se tornar o principal foco das ações do movimento dos direitos civis.

Mas é no ano de 1966 que King vai tomar a decisão que vai ter graves conseqüências para os três anos finais de sua vida: ele resolve deslocar sua ação no movimento dos direitos civis para as cidades do norte dos Estados Unidos. Isto vai lhe custar problemas praticamente insuperáveis tanto com os brancos liberais, que o apoiavam enquanto sua luta estava se dando na região sul do país, como com os setores negros do norte, que crescentemente se exasperavam com o pouco progresso de sua situação sócio-econômica num contexto de certo não-segregacionismo, mas ainda sim profundamente racista. Os distúrbios urbanos particularmente no norte do país exemplificavam em grande parte o desencanto com a estratégia não-violenta ardorosamente defendida por King. A manifestação mais veemente dessa desilusão é a proclamação do Black Power exatamente por dois dos principais líderes do Movimento Estudantil Não-Violento.

Ao alugar um apartamento no gueto negro de Chicago, King passa a viver com o cotidiano da vida dos negros numa grande metrópole do norte do país e de um grande centro do liberalismo norte-americano. É neste mesmo ano que King vai começar a se envolver no movimento contra a guerra no Vietnam. No ano seguinte, em março de 1967, no Coliseu de Chicago, durante uma grande demonstração contra a guerra, King lança um forte ataque à política militarista norte-americana não só no Vietnã, mas também em outras partes do mundo. Menos de um mês depois, King pronuncia outro discurso que veio a ser famoso – Além do Vietnam – Tempo de romper o silêncio, no qual explicita de maneira clara sua percepção da íntima conexão entre racismo, pobreza e militarismo. No restante do ano a situação social se agrava e se torna cada vez mais tensa e conflituosa, com distúrbios urbanos explodindo em distantes partes do norte do país com enorme número de feridos e mortos. Diante de tal quadro, King cada vez mais articula sua luta não-violenta contra o racismo com as lutas contra a guerra e a pobreza, explicitando cada vez mais com maior clareza a natureza estrutural-econômica de suas causas.

Em fevereiro de 1968 é deflagrada a greve dos trabalhadores dos serviços de água e esgoto de Memphis, no Estado do Tennessee. King resolve apoiar o movimento e durante uma marcha de protesto, a violência irrompe e deixa o saldo de um morto e cerca de cinqüenta feridos. No dia 3 de abril, King profere diante da assembléia dos grevistas o seu discurso “Eu estive no alto da montanha”. No dia seguinte King é assassinado.

Permitam-me, depois desta exposição da caminhada de Martin Luther King, fazer algumas observações sobre o seu legado.

O legado de King não admite a construção de nenhuma mitologia em torno de sua pessoa e obra. Como já foi dito no início, a melhor maneira de se não levar a sério a vida e a obra de King é transformá-lo em um mito que deve ser reverenciado. Certamente isso seria para ele mais do que repugnante. A verdade é, contudo, que em muitos círculos isto é o que acontece hoje com a figura de King, à semelhança do que ocorre com outras figuras tais como o próprio Ghandi e, entre nós, Dom Helder Câmara e Ernesto Che Guevara, ideologicamente tão distantes, humanamente tão próximos.

Uma das dimensões mais daninhas à figura histórica de King é sua apresentação como o líder solitário na luta pelos direitos civis. E a mídia tem sido em grande parte responsável por essa distorção histórica. Tal mito se afasta da realidade histórica da qual emergiu a maiúscula figura de King, colocando-se demasiada ênfase em suas extraordinárias qualidades como líder e não considerando devidamente os fatores conjunturais que possibilitaram e contribuíram para sua aparição e atuação em momento tão singular da luta contra o racismo nos Estados Unidos. Na verdade, a liderança nacional de King emergiu como fruto de uma rede de extraordinários líderes locais e regionais que junto às suas comunidades criavam as condições de mobilização e organização para que ações mais amplas promovidas e apoiadas pelas lideranças nacionais pudessem ser bem sucedidas.

Outra dimensão dessa distorção mítica da figura de King é a ênfase em sua capacidade oratória. Claro que King, como já foi dito, era um extraordinário pregador batista negro, que sabia usar magistralmente a retórica peculiar dos pregadores negros, que influenciados pela forma dialogal das narrativas africanas fazem com que haja durante os serviços religiosos uma espécie de dança e contra-dança entre quem prega e quem ouve o sermão, que resulta num envolvimento comunitário de alta densidade emocional. Aliás, um parêntesis, isto é o que faz a pregação pentecostal ter tanto sucesso em contextos africanos, quer na África, quer na diáspora africana em outros países como o Brasil, Cuba e os próprios Estados Unidos. Tal ênfase em sua retórica, muitas vezes parece insinuar uma certa manipulação emocional e religiosa da parte de Luther King de seus ouvintes, o que seria de fato uma grave distorção de sua mensagem, já que freqüentemente King em seus sermões e discursos ia contra a corrente conservadora teológica e política prevalecente entre brancos e negros protestantes norte-americanos. Ao lado da distorção de seus poderes oratórios, há uma certa ênfase em seu carisma como líder que carregava as massas a realizar o que lhe parecia o mais apropriado para uma certa conjuntura. Os estudos mais recentes mostram que ao contrário de manipulações carismáticas e emocionais, os ativistas sociais viam as ações lideradas por King como a expressão maior de muitos outros líderes, especialmente em nível local. Estudos recentes estão mostrando que grande parte das conquistas da luta pelos direitos civis sob a liderança de King foi resultado de um grande movimento de massa com base nas comunidades locais.

É claro que King tinha clara consciência de seus carismas, homem profundamente religioso que era. Mas ele também reconhecia que diante do racismo prevalecente na sociedade americana, carisma não seria suficiente para embasar e impulsionar a luta a que se propunha junto a muitos outros líderes. Também King sempre demonstrou profunda consciência com respeito a suas próprias limitações, inclusive com dúvidas profundas sobre os caminhos a seguir em certos momentos mais conflitivos. Uma das suas maiores angústias foi exatamente o fracasso em sua pregação da não-violência, mensagem que nunca conseguiu ganhar o apoio das grandes massas de afro-americanos, especialmente entre os mais jovens. Outra grande frustração de King foi sua incapacidade em ajudar a muitos de seus colegas pastores, negros como ele, a superarem suas ideologias e teologias conservadoras que, segundo ele, se constituíam em grande entrave para o avanço da causa dos direitos civis.

Outra grande angústia de King foi sua constatação que ao mover sua atuação para o norte dos Estados Unidos, os liberais brancos que estavam dispostos apoiá-lo enquanto ele lutava somente no sul do país, pouco a pouco foram retirando o respaldo à luta pelos direitos civis, especialmente quando passou a expressar com veemência suas opiniões contrárias à guerra no Vietnã e a vincular racismo, pobreza e militarismo, pregando mais do que reformas políticas a re-estruturação do sistema econômico-militar que produzia tanto o racismo, como a pobreza, no país e no mundo. O que de fato ele passou a defender tinha muito mais a ver com revolução do que com reforma, ainda que fosse uma revolução não-violenta!

A viúva e a filha Berenice, a mais nova dos quatro filhos

Se é verdade que sua formação religiosa e acadêmica foram importantes para a formação de sua estratégia de mudanças sociais, muito mais verdade, entretanto, é o fato que foi a própria realidade do racismo, da pobreza e do militarismo que se encarregou de mudar sua percepção da realidade sócio-política-econômica de seu país e do mundo, e, acima de tudo, de suas causas. Foi a decisão, aparentemente estapafúrdia, de Rosa Parks que jogou King no redemoinho dos direitos civis. Foi Chicago que fez com que King percebesse que as causas da pobreza eram muito mais intrincadas do que a segregação nos ônibus e escolas do sul dos Estados Unidos, e perceber que elas estavam profundamente inter-relacionadas com a pobreza dos guetos negros das grandes cidades do país. Foi o envolvimento do seu país no conflito no Vietnã que o levou a perceber o caráter internacional da exploração econômica sustentado pelo aparato capitalista-militar norte-americano. Quando se apercebeu finalmente de todas estas interconexões, o acadêmico pastor de Montgomery tornou-se perigoso para o sistema. Na medida em que seu idealismo liberal foi dando lugar a um não-violento realismo radical, o liberal The New York Times, após o discurso contra a ação do governo de seu país no Vietnã, o chamou de demagogo populista. Na medida em que King vai além de seu amor nacionalista por seu país e se firma, em nome de sua fidelidade a fé que abraça, seu compromisso internacional com os pobres, marginalizados e excluídos de todo mundo, seja no Peru, na África do Sul, ou no mundo dominado pelo comunismo soviético, King se torna uma grande ameaça, talvez mais perigosa que os militantes do Black Power. Na medida que é capaz de em seu calidoscópio perceber que pobreza, racismo e militarismo estão intrinsecamente relacionados com o poder econômico, King ultrapassa os limites liberais do permissível. Por isso, seu assassinato é seu destino inevitável. Para isso ele estava preparado. Por isso termina o seu discurso aos grevistas de Memphis, na noite anterior ao seu assassinato, dizendo:

“Como qualquer um, eu gostaria de viver uma vida longa. Longevidade é coisa boa. Mas eu não estou preocupado com ela agora. A única coisa que quero fazer é cumprir com a vontade de Deus. E Deus me tem permito chegar ao alto da montanha. E eu a tenho contemplado – a terra prometida. Talvez eu não entre nela acompanhando vocês. Mas nesta noite quero que vocês saibam que como um povo vamos entrar nessa terra prometida. E por isto estou feliz esta noite. Eu não temo nada. Nenhum homem me faz ter medo. Meus olhos viram a glória do Senhor.”

Diante dos desafios de um mundo globalizado debaixo do pensamento único e da ditadura do poderoso capitalismo financeiro internacional, a percepção de Martin Luther King Jr. da interconexão entre pobreza, racismo e militarismo e a mesma luta que ele travou contra os poderes que produzem tal mundo continuam reclamando um compromisso inabalável para todas as pessoas que acreditam que um mundo diferente é possível.


* Paulo Ayres Mattos é Professor da Faculdade de Teologia da Universidade Metodista de São Paulo (UMESP), São Bernardo do Campo, SP.

segunda-feira, 19 de novembro de 2007

Agostinho: luz e sombra

CORPO DE PSICÓLOGOS E PSIQUIATRAS CRISTÃOS - CPPC
JORNADA ANUAL CPPC/SP 2007

Agostinho: luz e sombra

O difícil equilíbrio: Conseqüências na doutrina e na saúde psicológica


24 de Novembro de 2007
Universidade Presbiteriana Mackenzie
Auditório Benedito Novaes Garcez (prédio 9)

PRÉ-INSCRIÇÃO ATÉ DIA 21/11/07!!!

Pagamento/confirmação da inscrição no local, no dia do evento, das 8h30 às 9h.

Membros do CPPC:
Profissionais, Colaboradores - R$ 35,00
Estudantes (graduação com comprovante) - R$ 15,00

Não Membros:

Profissionais (e demais interessados) - R$ 40,00
Estudantes (graduação com comprovante) - R$ 20,00

Informações e Inscrições:

Secretaria CPPC/SP
(11) 6951-7330
cppcsp@terra.com.br

sábado, 17 de novembro de 2007

Igrejas avivadas, mundo morto?

Para que servem igrejas avivadas em um mundo morto?

Rev. André Botelho*

O reverso do delírio paranóico do deus onipotente e da Igreja Ultra-Potente é o Deus que se revelou como fraqueza e confiou à Igreja seu carisma para salvar o mundo.

Uma espécie de consciência febricitante domina a Igreja em nossos dias fazendo-a pensar que não avança missionariamente porque lhe falta poder. Ora, poder significa dispor de força e autoridade ou ainda ter grande influência ou domínio sobre outrem. É neste sentido que, não muito longe, já vimos a sede de poder transformar a Missão da Igreja num exercício de força e intolerância. Percebemos que a obsessão pelo poder pode gerar o desprezo do carisma, levando a Igreja a caminhos nada cristãos. Pode tornar suas orações, celebrações, e, acredite, até a sua piedade em meros atos pagãos. O poder temporal em si não é um mal, contudo, se instrumentalizado em benefício próprio torna-se meio de exclusão e opressão. Quem já leu um pouquinho acerca da longa História da Igreja ‑ e sua relação com o poder dos príncipes ‑ não custou a perceber que a sedução do poder tornou o "Céu" o perpétuo lugar de Deus e a Terra a eterna realeza da todo-poderosa Igreja.

Hoje, aqui, muitas vezes distraídos, enquanto sonhamos com poder e em como tornar a Igreja mais poderosa, o mundo anseia por uma Congregação Cristã de humildade e fraternidade. Os desafios do tempo presente que interpelam a comunidade da fé são os clamores por uma instituição com carisma e não com poder ‑ no sentido de potestas.

Muitas instituições poderosas existem no mundo, mas os seus poderes não têm funcionado para resolver seus próprios defeitos morais, suas mazelas e suas injustiças. Carisma é a graça divina estampada no rosto de uma Igreja que não se fechou diante do desafio da evangelização e da humanização do mundo. Uma Igreja com poder fala e impõe, uma Igreja com carisma ouve e serve. O mundo resiste ao poder, mas acolhe o carisma. O poder cansa, o carisma renova.

Já não é a Igreja de Jesus Cristo cheia da Graça de Deus? Precisaria ela de mais poder? Não seria porventura o mundo quem, de fato, precisa de um avivamento urgente? Sobre isso penso ser inadiável um diálogo aberto.

Muitas vezes a Igreja pode estar lutando por conservar estruturas internas de poder, ao invés de manifestar abertamente a graça de Deus aos homens. Tomemos como exemplo a Igreja do Novo Testamento: apesar de suas muitas deficiências, mantinha-se como comunidade de grande vitalidade missionária. Era carismática no serviço! Se hoje somos “carismáticos” no poder, é porque nos falta poder de Deus para sermos carismáticos. Somos “avivados” na celebração e ultra-tradicionalistas na Missão! A Igreja pode ter recursos, conexões, instituições, mas ainda assim não ter influência alguma sobre a realidade e a sociedade. Apesar de sucessivos “avivamentos”, a Igreja permanece conservadora, na contramão da História e em extrema fragilidade moral e institucional, pois luz não se ouve ‑ luz se vê!

É desesperador notar como "carismáticos" de carteirinha não conseguem dialogar um minuto sequer sobre Missão de verdade. É neste sentido e por isto que devemos defender um diálogo franco e urgente em torno do verdadeiro significado da renovação espiritual para os dias de hoje. A Igreja deve mudar o foco do avivamento! Deve buscar uma renovação de sua consciência, precedida de uma conversão radical do seu coração. Precisa viver uma kénosis (esvaziamento total) de qualquer tipo de poder cultivado em seu interior incompatível com a sua verdadeira vocação cristã. Assim, ela deve perseverar na Fé e manter-se pura diante da tentação de prostituir-se com poderes partidários egoístas e mesquinhos, perdendo a única autoridade conferida por Deus a si: que é a de ouvir, servir, denunciar-profetizar e, se preciso for, colocar-se no lugar de quem sofre e morrer com os que morrem.

Se muitos falam de unção como poder, poucos falam de poder como unção para servir. Linhas “carismáticas” extremadas são dadas como o modelo ideal de povo de Deus em quase todas as igrejas do nosso país, mas nem sempre as atitudes revelam a misericórdia e o amor revelados em Jesus de Nazaré. Diante do testemunho do Senhor não resistem argumentos: importa amar ou amar! Quem vive buscando mais poder para a Igreja nega a Graça de Deus que nela está. Quem vive esperando mais poder acaba tornando-se fraco e omisso diante do desafio que diante de si está por fazer. Para que servem igrejas avivadas em um mundo morto?

Acredito que a expectativa do mundo seja por uma Igreja muito mais humana e amorosa do que "avivada" e "poderosa". Acredito que o mundo deseje ardentemente aquilo que a Igreja tem recebido e que deve compartilhar consigo: a Graça de Deus transformada em Carisma Eclesial. Somos Igreja não porque merecemos ou decidimos, mas porque o amor de Deus está entre nós; é unicamente neste sentido que podemos pregar a "conversão de todos os povos" e imaginar uma Igreja: uma comunidade de irmãos dinamizada pelo amor gratuito de Deus e que se organiza conscientemente como fraternidade radical.

Poder não gostamos de repartir. Poder gera divisão entre nós: normalmente afasta, exclui e “cria” ungidos. Carisma aproxima e realiza!

Precisamos, por isso, de um novo avivamento que nos ensine a compartilhar a Graça de Deus em nós com o mundo. Precisamos de uma renovação espiritual constante que nos mantenha sempre abertos para o amor e para o serviço. Que nos ensine que o Poder de Deus não é outro que não o poder de amar e servir, isto é, o inverso do delírio paranóico de uma Grande Igreja Ultra-Poderosa. Nossa inspiração não pode ser fabulosa, sustentada na imagem de um deus onipotente. Nossa inspiração é concreta, revelada no testemunho do Deus poderoso no amor, que se fez fraqueza e sacrifício vivo em Jesus Cristo e que confiou na fraqueza dos homens tornada Igreja a sua Graça para salvar o mundo re-criando a Criação.

E é exatamente por isto que Deus não pode usar o poder da Igreja para salvar o mundo, mas apenas a sua fraqueza confessada.


* André Botelho é doutor em teologia (PUC-RJ) e professor do Seminário Cesar D'Accorso Filho (Faculdade de Teologia do Bennett). É pastor da Igreja Metodista em Jardim Oceânico (Barra da Tijuca, Rio de Janeiro, RJ)


Profetas e profecias

Sobre profetas, profecias e rock nacional...

Rev. Antonio Carlos Soares dos Santos*

“Com tanta riqueza por aí...onde é que está? Cadê sua fração?” (Plebe Rude)

“Terceiro Mundo, se for...piada no exterior, mas o Brasil vai ficar rico, vamos faturar um milhão...quando vendermos todas as almas, de nossos índios num leilão!” (Legião Urbana)

Venha! Meu coração está com pressa...Quando a esperança está dispersa só a verdade me liberta...Chega de maldade e ilusão...” (Renato Russo)

(Isaías 1:17) - Aprendei a fazer bem; procurai o que é justo; ajudai o oprimido; fazei justiça ao órfão; tratai da causa das viúvas.

(Amós 8:6) - Para comprarmos os pobres por dinheiro, e os necessitados por um par de sapatos, e para vendermos o refugo do trigo.

(Miquéias 6:8) - Ele te declarou, ó homem, o que é bom; e que é o que o SENHOR pede de ti, senão que pratiques a justiça, e ames a benignidade, e andes humildemente com o teu Deus?

Nosso rock nacional está cheio de profecias! Como? Rock? Profecia? É verdade! Basta ler as letras das músicas das bandas de rock nacional que veremos o reflexo das profecias do Antigo Testamento. Exagero de minha parte? Não acho...é questão de interpretação e...profecia! A verdade é que no meio de tantos atos, danças, louvores e pregações proféticas...nos perdemos num turbilhão de “profetas”! Qual o último grande líder cristão/protestante que trouxe uma grande mudança na esfera social?Posso estar enganado, mas foi Martin Luther King. Depois dele, a igreja se calou! Calou mesmo...não há outro depois de Luther King que tenha influenciado a sociedade de maneira tão marcante! Martin Luther King foi um profeta na concepção literal da palavra! Reunia multidões não para shows, nem para mostrar força com quantidades...mas para revelar a Palavra de Deus tal como esta: O que me preocupa não são os gritos dos maus, mas o silêncio dos bons!

Atualmente vemos multidão, mas não vemos transformação...não vemos grandes profecias..profecias como de Isaias, Amós, Miquéias...Onde estão as denúncias? Onde estão as vozes que clamam no deserto? Cada vez mais vejo que nossas mensagens estão distantes daquilo que Jesus dizia...Hoje as pessoas escutam as pregações com a tranquilidade da mente de um bebê...não me diz nada...não me incomoda em nada. Tenho tentado me policiar para não cair nas mensagens vazias de conteúdo e elemento de conversão. Nas mensagens em que fala-se muito e não dizem nada, porque não tem nada a dizer! Estamos prendendo a membresia e trazendo outras por meio da “graça barata”...

Então me virei para o rock nacional e encontrei ali... “profecias”! Confesso isso arriscando tudo...posso ser tachado de “mundano”...mas...vou tentar seguir em frente. Cada letra cantada expressa indignação... um desejo de mudança...uma esperança...um convite para luta...uma denuncia consistente!

Nada de letras sem sentido algum para a maioria das pessoas, nada de Jesus saltando pelos montes como um cabrito eufórico ( que na verdade é uma passagem da qual nada tem a ver com Jesus)...mas fala a linguagem que quem passa entende...do jeitinho que Paulo recomendou aos Corintios (I Cor 14.23-25). Isaías devia ser um vocalista e guitarrista de banda de Rock...Miquéias baixista e Amós baterista...pronto! Poderiam cantar essas profecias pronunciadas nas páginas da Bíblia e aquecer nossos corações, encher-nos de coragem e ousadia...

A música brasileira foi o maior instrumento de resistência na época da ditadura...nos anos 80 foi a que mais denunciou a corrupção e o descaso das autoridades (in) competentes...Sabe de uma coisa? Podemos ter uma democracia firmada...mas as desigualdades são as mesmas! A corrupção é a mesma! Onde estão as vozes dos 30 milhões de evangélicos no Brasil? Não..não venham com essa história de imprensa, de Rede Globo... Quando a voz é alta não há que não ouça! A verdade é que estamos calados e vivendo um “ avivamento” anti bíblico, superstar, arrogante e voltado para nós mesmos! Queremos aparecer ao país da maneira errada...Lembram quando Gideão quis vencer os midianitas com 32 mil homens? Deus disse que era demais! Só trezentos bastava...trezentos que não se abaixaram como cães...trezentos que não eram medrosos.

(Miquéias 3:5) - Assim diz o SENHOR acerca dos profetas que fazem errar o meu povo, que mordem com os seus dentes, e clamam paz; mas contra aquele que nada lhes dá na boca preparam guerra.

O povo está pedindo paz! O povo pede mudanças! Não vamos nos iludir com os templos cheios porque multidão não é sinal de presença de Deus! Voltemos a nossa função profética: Denunciar e consolar! Estamos caindo no pecado da omissão...nossas vozes estão caladas nos templos e sufocadas no “jeito gospel de ser”. Jesus já advertia: E, respondendo ele, disse-lhes: Digo-vos que, se estes se calarem, as próprias pedras clamarão. (Lucas 19:40)

Enquanto isso, as “pedras” clamam cada vez mais alto:

A gente não quer só dinheiro a gente quer dinheiro e felicidade... a gente não quer só dinheiro a gente quer inteiro e não pela metade... (Titãs)

* Antonio Carlos Soares dos Santos é Pastor da Igreja Metodista em Altamira, PA

Os "novos" vendilhões do templo

Os “novos” vendilhões do templo

Rev. Antonio Carlos Soares dos Santos*


O programa de um famoso pastor estava começando. Eu, em frente a TV, observava negligentemente mais uma das repetitivas “atrações” do mundo gospel brasileiro. Nada de novo: músicas com letras parecidas, coreografias, show de luzes, em alguns momentos tive a ligeira sensação de que já tinha visto tal programação em outro lugar. Engano meu, o programa estava estreando naquele dia. Quando entrou o famoso pastor esperava que a mensagem fosse a salvação daquela espécie de “culto”. Mas, o “ungido” pregador leu um texto da Bíblia e depois apenas repetia as passagens lidas de forma emotiva e gritando...Algumas poucas pessoas choravam e por isso mesmo, a câmera fixava sempre nelas.


Algo passou a me chamar a atenção no pastor: suas roupas e sua insistente informação de que era “doutor em divindades”. As roupas eram claramente de valor alto! Os sapatos não eram encontrados em qualquer sapataria do Brasil! Até hoje não sei o que é um “doutorado em divindades”( e nem sei se quero saber!). Em seguida, para não fugir do modelo dos programas evangélicos na TV brasileira, o amado pastor, olhando fixamente para câmera, e com o semblante de espiritual, pediu contribuições para o seu programa e para seu ministério que percorre o Brasil e o mundo. Logo depois, surge uma propaganda que me deixou, digamos, admirado! A propaganda de um culto de Adoração em determinada cidade, e o narrador anuncia alegremente: Você pode comprar o ingresso antecipadamente com desconto! Mas corra, é por tempo limitado! Aquele foi o sinal para que eu mudasse de canal e ficasse o dia todo angustiado e até mal humorado.

Lembrei-me do episódio de Jesus e os vendilhões do Templo. Sempre imagino o rosto irado de Jesus ao chegar no Templo e encontrar vendedores e mercenários fazendo “negócios” com fiéis. Imagino Jesus derrubando bancas, chutando, literalmente, o “pau das barracas”. Não me lembro de outra passagem do Evangelho em que Jesus demonstrasse tanta raiva e indignação, nem mesmo com os irritantes fariseus. Ao que parece, para o Nosso Senhor, não havia nada pior do que a exploração da fé do povo.

O que pensaria ou o quê pensa Jesus a respeito de nossas caríssimas, conferências, convenções, seminários e agora, até mesmo, culto de Adoração? O que pensaria ou o quê pensa o Nosso Senhor dos shows emotivos e piegas onde se cobram ingressos para oferecer aquilo que deveria ser de graça? No lugar de pastores de ovelhas encontramos gerentes de Marketing! Escravos da estatística! Olhos que enxergam números e não vidas! Novos vendilhões do Templo! Mercadores da fé! Transformaram a Igreja de Jesus em um covil de ladrões e salteadores! Está em vigor hoje as novas vendas de indulgências para se alcançar o Reino dos Céus! “Venham, é a lei do Mercado Gospel! É a lei da oferta e da procura!”

O que dizer das mensagens pregadas? Onde estão as mensagens que dizem para amar os inimigos, oferecer a outra face, não julgais para não serem julgados, mas... Você está julgando, pastor! Sim, estou... Incluam-me nessa lista de desvio pastoral...Onde estão as mensagens de “buscar o Reino de Deus e sua justiça em primeiro lugar...” Chega de quebra de maldições, pois já foram quebradas no Calvário todas elas! Chega de promessas de bênção material! Chega de engano!!! Basta de vendas na porta do Templo! A Igreja do Senhor não é um circo e nem passarela de moda e de egos inflados!

Estamos precisando urgentemente de mulheres cananéias que aceitam até mesmo as que migalhas caem da mesa, de centuriões romanos que bastam ter a fé na Palavra simplesmente, de Zaqueu e Mateus, que devolvem em dobro o que roubaram e largam tudo para seguir a Jesus...Estamos precisando de Bartimeu, que não se cansa de clamar por Jesus mesmo quando impedido pelos discípulos, de Paulo, que saiba viver e louvar ao Senhor em qualquer situação, na fartura e na escassez...Estamos precisando de meninos e meninas que tenham apenas cinco pães e dois peixes e ainda assim queiram partilhar... Não precisa mais do que isso. O Senhor precisa de Pastores de Ovelhas e não de Mercenários egocêntricos.

Espero que esta mensagem sirva de alguma forma para edificar sua vida...pois ela vem de encontro com a minha.

* Antonio Carlos Soares dos Santos é Pastor da Igreja Metodista em Altamira, PA