sexta-feira, 4 de outubro de 2013

Na Presença de Meus Inimigos

Amanhã, 30 de setembro de 1974, há trinta e nove anos fui sequestrado pelo Exército Brasileiro.

Este é o sermão que preguei hoje:

“Na Presença de Meus Inimigos"



Sermão por Rev. Fred Morris[1], pregado na Igreja Metodista Unida Shandon em 29 de setembro de 2013.

Objetivo: Compartilhar com o povo a minha experiência de ter sido sequestrado e torturado pelo Exército Brasileiro - como testemunho da Graça de Deus sobre nós, mesmo nas piores circunstâncias. 


Atenção: Eu não deveria estar aqui hoje. Eu deveria ter “desaparecido” há 39 anos – amanhã – em 30 de setembro de 1974.

Este foi o dia no qual os militares brasileiros vieram me buscar.

Eu morava no Brasil há onze anos, servindo como missionário da Igreja Metodista Unida (United Methodist Church). Depois de ter estudado português por um ano na cidade de Campinas, fui nomeado pastor em três pequenas igrejas na região serrana, a cerca de duas horas da cidade do Rio de Janeiro. Fui transferido, após dois anos, para um bairro popular na zona norte da cidade do Rio – no lado esquecido da cidade, por assim dizer. Servi na Igreja Metodista de Pilares e em três de seus trabalhos nas favelas vizinhas.

Após uma licença de dois anos, durante a qual obtive o mestrado em Sociologia Urbana na Universidade de Chicago, a Igreja Metodista no Brasil solicitou minha volta para enviar-me a Recife, na região empobrecida do Nordeste brasileiro, para implantar e dirigir um Centro Comunitário em um bairro extremamente pobre de Olinda, a cidade-irmã de Recife.

Também pediram que eu trabalhasse com o Arcebispo da Igreja Católica de Recife, Dom Helder Câmara, um homem notável, três vezes indicado ao Prêmio Nobel da Paz por seu trabalho em favor dos pobres no Brasil e por suas campanhas internacionais contra a tortura e assassinatos cometidos pelo Exército Brasileiro como métodos de perpetuação no poder.

O arcebispo Câmara era totalmente favorável a trabalhar comigo para melhorarmos as relações entre protestantes e católicos. Logo iniciamos um grupo chamado “Equipe Fraterna”, que chegou a incluir três pastores metodistas, um pastor luterano e sua esposa, um seminarista presbiteriano, dois sacerdotes episcopais anglicanos, dois monges beneditinos, um padre jesuíta, um monge franciscano e freiras das mais diversas ordens.

Encontrávamos-nos todas as terças-feiras das 10h da manhã às 12h. A primeira hora era dedicada ao estudo bíblico, seguido por um período de avaliação do trabalho de um dos membros do grupo. (Trabalhávamos todos junto às parcelas mais pobres da população). Então terminávamos compartilhando a Eucaristia, a Santa Comunhão, presidida a cada semana por um pastor ou padre diferente, cada um de acordo com seus próprios costumes.

Além destas atividades, fui convidado a ser um assistente da revista Time. “Assistente” é o cargo mais baixo no jornalismo, geralmente servindo como carregador para os jornalistas plenos. Depois de ter consultado meu “chefe” em Nova Iorque, aceitei o pedido já que pensamos que tal fato poderia prover uma espécie de seguro de vida para o Arcebispo, que estava sendo atacado pelos militares desde o outono de 1969 quando sequestraram e assassinaram um jovem padre que trabalhara com ele na Universidade Federal do Recife. A casa do bispo havia sido metralhada duas vezes como advertência.

Nunca me preocupei com minha segurança, já que presumia que, como cidadão americano, o pior que poderia acontecer comigo caso os militares ficassem descontentes comigo seria minha deportação.

Bem, em junho de 1974 a revista Time publicou um artigo sobre o Arcebispo chamado “O Pastor dos Pobres”, que descrevia como Dom Helder trabalhava em favor de milhões de pobres em sua diocese. E a reportagem mencionava suas diversas denúncias contra o uso de tortura e desaparições de opositores do regime.

Embora a Time soubesse que eu era amigo e colaborador próximo do Arcebispo, sequer fui consultado sobre o artigo e tampouco sabia que ele estava para ser publicado. Mas o Exército Brasileiro estava, conforme descobri mais tarde, seguindo meus passos desde que conheci o Arcebispo e tinha minhas habilidades jornalísticas em mais alta conta que a própria revista, já que presumiram que eu havia escrito o artigo.

Desta forma, fui chamado ao Quartel General do Quarto Exército três vezes em agosto para um escrutínio um tanto quanto severo sobre minhas atividades. Estas visitas terminaram com advertências para que eu parasse de brincar de jornalismo e para evitar "más companhias", ou seja, o Arcebispo.

Respirei aliviado e notifiquei a Time que eu não mais seria um “assistente” (o que não fez a menor diferença já que eles não tinham nenhum interesse real no Nordeste). Também notifiquei Dom Helder para que suspendêssemos contatos por algum tempo.

Mas o pior ainda não havia passado, de forma alguma. E na segunda-feira, 30 de setembro de 1974, enquanto saía de meu apartamento com um amigo a cerca de pouco antes das 10h da manhã, fomos cercados por uns doze homens, armados com submetralhadoras e pistolas calibre 45. Fomos algemados, vendados e jogados no chão de uma picape GM. Senti o cano de uma metralhadora em minhas costelas enquanto rasgávamos as ruas de Recife em direção ao Quartel General do Quarto Exército, no centro da cidade. (Conhecia a cidade suficientemente bem e acompanhando as conversões à direita e à esquerda sabia exatamente aonde chegaríamos afinal.)

Nos arrancaram da caminhonete e nos obrigaram a tirar as roupas, com exceção das cuecas. Meu relógio e anel foram tirados. Fui novamente algemado e levado a uma cela que se tornou minha casa por um tempo indefinido.

Em alguns minutos ouvi meu amigo Luis gritar na cela ao lado, quando começaram a torturá-lo. Esperava ainda que minha cidadania estadunidense pudesse me trazer algum tipo de imunidade no tratamento, mas a esperança não durou muito quando vieram me buscar.

Com a cabeça encapuzada e mãos algemadas às costas fui empurrado e conduzido por um corredor de 13 a 16 metros até uma sala que seria para mim uma câmara de tortura.

Durante o caminho recitei silenciosamente o Salmo 23.
O SENHOR é o meu pastor; nada me faltará ... Ainda que eu ande pelo vale da sombra da morte, não temerei mal nenhum, porque tu estás comigo.


Assim eu fazia todas as vezes que me arrastavam e, estranhamente, sentia uma calma e confiança que certamente não combinavam com as circunstâncias.

Assim que me jogavam na sala, quatro ou cinco homens começavam a me espancar, jogando-me de um lado a outro da sala. Quando eu parava de ser jogado de lado a outro dizia: Sou um cidadão norteamericano. Exijo ver meu Cônsul. Aquela foi a primeira vez que fui chutado na virilha, caindo ao chão.  Assim que conseguia ficar em pé eu era atacado novamente, com socos e pontapés de todos os lados.

Depois de mais ou menos 15 minutos de espancamento, de repente tudo ficava quieto e parecia que a maioria das pessoas haviam deixado a sala. Fiquei lá, tentando respirar, em dor por causa do ataque. Então ouvi alguém despejando água num balde. 

Oh, não! Pensei comigo. Não conhecíamos ainda o afogamento simulado naqueles dias, mas eu sabia que uma das formas de torturas favoritas do Exército Brasileiro era quase afogar a vítima em um balde d’água e reanimá-la para continuar o interrogatório.

Mas não era isso que me aguardava. O homem veio até mim, ainda encapuzado e algemado, e despejou água nos meus pés e no chão ao meu redor. Então veio e prendeu um eletrodo no meu dedão do pé direito e outro no meu mamilo direito com um gancho que perfurou a carne. Então ele veio e pude ouvi-lo puxar uma cadeira e sentar-se. 

Em seguida, começou a perguntar. Onde estava indo com o Alanir? Quem é Alanir? Respondi, já que o nome era desconhecido para mim. Recebi a primeira descarga elétrica – uma leve, mas que em breve aumentou até provocar convulsões musculares que me jogaram ao chão. Enquanto eu me debatia, deitado no chão úmido tentando levantar-me, ele dava pequenas descargas elétricas, como aquelas que se usam para tocar o gado, para que eu me levantasse. Assim que me levantei, mais perguntas. E mais choques elétricos, quedas ao chão, levantar, mais perguntas, mais choques, levantar...

A dor dos choques elétricos era insuportável. Pensei que caso continuassem, eu morreria naquela sessão. Mas então percebi que passei a um estado de “não mais ali”, onde a dor transformou-se em uma espécie de esquecimento, como uma experiência "fora-do-corpo" onde eu testemunhava algo sendo feito a alguma outra pessoa. 

A dor se transformou em um tipo de entorpecimento. Algo enevoado, nada bom, mas menos doloroso.


Eles pareciam ter entendido, então fui levado de volta à minha cela, onde fui dependurado na porta para "descansar" por um tempo, para ressensibilizar meu corpo.

Então, de volta à câmara de tortura. Salmo 23 no caminho. Eletrodos colocados, mais perguntas, mais choques, cair, levantar, cair, levantar.

Em uma dessas quedas, com minhas mãos às costas, eu torci feio meu pulso direito e senti-o inchar-se, com as algemas cortando meu pulso.

Então, por volta da terceira ida, meu torturador veio até mim e colocou o eletrodo em meu pênis, ao invés de em meu mamilo, prometendo com um cochicho que se eu não cooperasse com ele, ele o arrancaria de tanto choque.


Mais algumas idas e eu fui colocado em uma poltrona chamada de Cadeira do Dragão. Meus braços foram presos nos braços da cadeira com fivelas de couro; minhas pernas foram presas em frente da cadeira. Desta vez colocaram um eletrodo no meu dedão e outro no lóbulo da orelha direita. Aqueles foram os piores choques de todos, já que as descargas elétricas percorriam minha cabeça entorpecendo tudo e cheguei a perder a consciência uma vez ou duas.

Isso durou o dia todo até que eles se cansaram. Deve ter durado, acho, até mais ou menos às 10h da noite. Desta vez me levaram de volta à minha cela e me algemaram nas barras à altura dos olhos, de forma que não consegui sentar ou deitar. Desta forma era impossível dormir, então passei a noite em pé ou apoiado nas barras da minha cela, aguardando a primeira luz do dia, quando voltaram a me buscar.

Isto continuou com algumas mudanças e variações por quatro dias e noites. Na quarta-feira à noite eu fui jogado no chão da cela e dormi um pouco no chão de concreto.

O que eles queriam?
Depois de tudo o que foi dito e feito, o que eles queriam era que eu dissesse que era comunista e que o Arcebispo colaborava com o Partido Comunista do Brasil. Esperavam que eu delatasse o Arcebispo, dizendo que ele era comunista, ou pelo menos cooperador com os comunistas. Pareciam pensar que se fizessem que um missionário metodista delatasse um Arcebispo católico eles conseguiriam desmoralizá-lo e diminuir sua eficácia em sua oposição ao uso de tortura e assassinato por parte dos militares como forma de perpetuação no poder.

Orgulho-me em dizer que não cooperei com eles em nada neste sentido.

Finalmente, na quinta-feira, dia 3 de outubro, logo no começo da tarde, o Major Maia, o chefe da operação de tortura, veio até mim e disse que queriam que eu tomasse um banho, me vestisse já que eles me levariam para me encontrar com o Cônsul norteamericano no Recife. Acrescentou que eu deveria ser cuidadoso com o que eu diria, já que voltaria para lá.

A minha resposta, improvável àquela altura, foi rir alto.

 À qual o Major perguntou: “O que é tão engraçado?"

"Nada”, eu disse, “mas você me lembrou de uma piada que vi na tevê alguns anos atrás.” Quando o presidente Eisenhower visitou a Rússia, os líderes, querendo impressioná-lo, trouxeram um camponês e disseram que ele poderia dizer qualquer coisa ao presidente dos EUA. O velho ficou quieto e não disse nada. Eles insistiram que ele poderia se sentir à vontade para dizer o que quisesse. Então, olhando para a câmera de tevê, disse: Socorro!!

O Major Maia riu comigo, mas repetiu o aviso. 

Então tomei uma ducha – a primeira vez em quatro dias sombrios – vesti-me e fui conduzido a um Batalhão de Comunicação na periferia de Recife.

Fui recebido por um Coronel, que me levou a um quarto que servia claramente para hospedar oficiais visitantes. Parecia um Ramada Inn meio decadente, mas tinha uma cama, duas poltronas, uma mesa e um jarro com água gelada!

O coronel me deixou sozinho, dizendo que o Cônsul norteamericano chegaria em breve.

Tomei um copo d’água e sentei-me, aguardando ansiosamente a chegada do Cônsul.

Percebi um movimento do lado de fora da janela daquele quarto. Olhei com atenção e vi que um soldado brasileiro, vestindo farda camuflada, desceu de uma árvore no jardim atrás do prédio. Enquanto olhava, ele se esgueirou pelo gramado até que ele parou e percebi, quase caindo para trás, que seu fuzil, um daqueles grandões com um “bi-pé” na ponta, estava apontado para a minha testa!

De repente percebi que talvez aquilo estivesse sendo armado para minha execução. Era bem conhecido que o Exército Brasileiro costumava assassinar prisioneiros dizendo depois que eles tentavam escapar, ou que havia sido um erro de identidade, o que fosse. Será que o Major Maia disse-me que eu iria ver meu Cônsul só pra me dar um banho e colocar roupas limpas para poder me executar?

Era por volta das 4h30 da tarde, caía a noite em Recife. Levantei-me e desliguei a luz e sentei-me novamente na sala que ficava cada vez mais escura, determinado a tornar as coisas pelo menos mais difíceis para eles. Depois de 30 segundos a porta se abriu e um cabo entrou, ligou as luzes e deixou o quarto, desta vez confirmando meus temores de que seria executado.

Quanto mais eu pensava nisso, mais sentido fazia tudo aquilo. Eu sabia que se caso conseguisse sair daquela situação, eu diria a Deus e ao mundo o que haviam feito a mim. Tinha certeza que a Junta de Missões Globais da Igreja Metodista Unida me levaria para longe para fazer conferencias em todos os EUA para obter apoio no combate à violação de direitos humanos na América Latina naquela época. Se me matassem, alegando ser um erro, haveria algum barulho, mas acabaria em breve e seria o fim.

Então sentei-me lá, percebendo que aquele dia 3 de outubro de 1974 seria meu último dia de vida na terra.

E, engraçado, eu não estava com medo.
Não sou nenhum John Wayne ou nenhum 007. Não me considero capaz de grande coragem frente a perigos. Mas enquanto estava lá sentado, esperando a bala ser disparada pelo soldado, uma grande paz me envolveu como um edredom quente. Uma Paz que Excede todo o Entendimento tomou conta de mim. Eu posso fazer isto. Tudo bem. Mais tarde eu percebi que este é aquilo que o Apóstolo Paulo quer dizer com o Dom da Paz.

Então, após uma espera de 40 minutos até que o soldado recebesse a ordem de atirar, a porta se abriu e o coronel entrou com o Sr. Richard Brown, o novo Cônsul norteamericano no Recife.

Já que eu era o “anfitrião” em meu novo quarto, eu educadamente indiquei que o coronel se sentasse em frente da janela, onde ele estaria entre mim e o fuzil lá fora, e coloquei o Sr.Brown à minha esquerda.

Nunca havia me encontrado com o Sr.Brown, já que ele estava em Recife há pouco tempo. Ele começou perguntando se estava sendo bem tratado enquanto em custódia. Lembrei das ameaças feitas pelo Major Maia, então disse que estava bem, mas pisquei pra ele com meu olho que estava longe da vista do coronel. O Sr.Brown entendendo na hora disse: Sr.Morris, estou aqui em nome do governo dos Estados Unidos da América, e se o senhor estiver sendo maltratado de alguma forma, nós faremos o diabo pagar.

Era tudo o que precisava, então continuei contando a ele nos mínimos detalhes tudo o que havia acontecido comigo desde segunda-feira, pancada por pancada. Ele tirou um caderno e anotou tudo o que disse a ele. Depois de uma hora e meia a porta se abriu e o cabo veio dizer que a entrevista terminara. O Sr.Brown então perguntou se eu teria qualquer marca no meu corpo que corroborasse o relato. Imediatamente tirei minha camisa e mostrei-lhe os hematomas e arranhões em minhas costas e braços. Então baixei minhas calças de forma que o coronel pudesse ver as enormes marcas roxas nas minhas nádegas, resultado das minhas repetidas quedas enquanto aguentava os choques elétricos.

Enquanto deixava, o Sr.Brown disse: Se algo semelhante voltar a acontecer contigo, cabeças vão rolar, falando claramente para os gravadores, já que sabíamos que tudo o que estava sendo dito também estava sendo gravado. Também prometeu voltar todos os dias até que fosse solto, para ver se estava sendo bem tratado.

Não permitiram que ele voltasse no dia seguinte, mas ele apareceu todos os dias pelas duas semanas seguintes.

Depois de mais 14 dias, um atraso que creio ter sido para que meus hematomas desaparecessem e minhas feridas se curassem, fui levado ao Aeroporto Internacional do Rio de Janeiro, sob a mira de revólveres, e colocado em um avião para Nova Iorque, onde meu irmão, o rev.Hughes B.Morris, que era então pastor de uma Igreja Metodista em Nebraska, e dois executivos da Junta de Missões Globais da IMU, o rev.Paul McCleary e o rev.Lewistine McCoy, que havia sido meu "chefe" direto nos onze anos anteriores.

Eles me informaram que eu não era mais empregado da Junta de Missões Globais, sem dar nenhuma explicação, e depois de uma hora, desejaram "o melhor".

Sem qualquer pagamento indenizatório ou qualquer tipo de ajuda, me mudei para Washington DC e comecei uma campanha pelos direitos humanos.

A revista Time pediu que eu escrevesse um artigo, o qual foi publicado na edição de 18 de novembro de 1974. Levaram-me ao Today Show, oe a outros 26 programas de tevê nos EUA e no Canadá. Falei em mais de 150 faculdades, universidades e igrejas, de Harvard e Yale até na Universidade de Chicago, UCLA e USC.

Em 11 de dezembro, testemunhei sobre minha experiência diante de um comitê do Congresso Americano. Em outubro de 1975 a revista Harper's publicou um relato de nove páginas com minhas experiências. Como resultado de todas essas atividades, em junho de 1976 o Congresso dos EUA votou para cortar qualquer ajuda militar ao Brasil – para sempre.

Depois de cerca de dois anos desempregado (havia entrado nas listas negras da CIA – por “ser um comunista” – e da própria Igreja Metodista Unida por razões não especificadas, fui para a Costa Rica e montei minha própria empresa de construção para sustentar a mim e a minha família por doze anos. 

Em 1977 fui convidado pela ABC-News para ser seu correspondente na Costa Rica e em 1982 comecei a publicar um boletim em San Jose, Costa Rica, sobre a América Central, chamado Mesoamerica. Logo se tornou a publicação mais importante na região e orgulho-me em dizer que ela desempenhou um papel importante na ajuda a muitas igrejas e grupos de solidariedade a estudantes que se opunham aos ataques genocidas promovidos por Ronald Reagan aos povos da região e que impediu que os EUA enviassem tropas à Nicarágua e a El Salvador.

Mas para mim o período mais importante na Costa Rica foi quando conheci e casei com minha adorável esposa, Argentina. Celebraremos nosso 30º aniversário de casamento ano que vem.

E o que faremos com essa história estranha?

Em primeiro lugar, eu não acredito que fosse vontade ou plano de Deus que eu fosse sequestrado e torturado. Foi uma experiência insuportavelmente horrível que nunca mais deveria ser repetida a nenhum ser humano - por qualquer razão que seja.

Todavia, creio que demonstra o que o Apóstolo Paulo diz em Romanos 8.28 “
Sabemos que todas as coisas cooperam para o bem daqueles que amam a Deus, daqueles que são chamados segundo o seu propósito.”

Isso não significa que tudo o que aconteça seja a vontade ou propósito de Deus. Significa apenas que já que amamos e confiamos em Deus, Deus pode nos abençoar mesmo nas piores circunstâncias possíveis.

Se eu não tivesse sido sequestrado e torturado em 1974, provavelmente estaria ainda morando no Brasil e não teria conhecido Argentina e nossos três filhos maravilhosos não existiriam.

Mais uma vez, o Apóstolo Paulo acerta ao terminar o capítulo 8 de sua carta aos Romanos:
Que diremos, pois, à vista destas coisas? Se Deus é por nós, quem será contra nós? Aquele que não poupou o seu próprio Filho, antes, por todos nós o entregou, porventura, não nos dará graciosamente com ele todas as coisas? Quem intentará acusação contra os eleitos de Deus? É Deus quem os justifica. Quem os condenará? Ninguém. É Cristo Jesus quem morreu ou, antes, quem ressuscitou, o qual está à direita de Deus e também intercede por nós. Quem nos separará do amor de Cristo? Será tribulação, ou angústia, ou perseguição, ou fome, ou nudez, ou perigo, ou espada? 

Em todas estas coisas, porém, somos mais que vencedores, por meio daquele que nos amou. Porque eu estou bem certo de que nem a morte, nem a vida, nem os anjos, nem os principados, nem as coisas do presente, nem do porvir, nem os poderes, nem a altura, nem a profundidade, nem qualquer outra criatura poderá separar-nos do amor de Deus, que está em Cristo Jesus, nosso Senhor


Tradução: Fabio Martelozzo Mendes - revisado pelo autor.



[1] Rev.Fred Morris foi missionário da Junta de Missões Globais da Igreja Metodista Unida no Brasil entre 1969 e 1974 e foi o primeiro cidadão norte-americano a ser torturado pelo regime militar brasileiro. Em 2008 ele foi julgado e anistiado pelo governo brasileiro. Atualmente serve como pastor da Igreja Metodista Unida Shandon, na Califórnia.




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