sexta-feira, 29 de novembro de 2013

Moisés da Rocha - Símbolo da Luta pela Valorização da Cultura, Fé e Negritude

Moisés da Rocha - Símbolo da Luta pela Valorização da Cultura, Fé e Negritude




A leiga metodista Diná da Silva Branchini foi agraciada, nesta terça-feira, 26/11, com o Prêmio Benedicto Galvão, oferecido pela OAB-SP às pessoas que se destacam na luta pelos direitos da população afrodescendente.

Todavia, ela não é a primeira pessoa da Igreja Metodista a receber tal reconhecimento. Em 2012, o radialista Moisés da Rocha, membro da Igreja Metodista no Ipiranga-SP (3ª Região), recebeu o prêmio. Moisés é conhecido por seu trabalho como historiador do samba e da música popular brasileira em seu programa "O Samba Pede Passagem", transmitido pelas rádios USP FM e Rádio Capital.

Além de seu trabalho de resgate e valorização da cultura musical da raça negra, em seu trabalho como radialista, Moisés também atua na difusão da cultura musical cristã de influência africana, através do Coral Resistência de Negros Evangélicos.



"Samba e Ecumenismo

Para quem vive em São Paulo, o nome do radialista Moisés da Rocha é imediatamente relacionado a O Samba Pede Passagem, programa que, há décadas, ele apresenta pela Rádio USP/FM. Assim como anuncia as músicas, seus intérpretes e compositores, ele noticia eventos das escolas de samba, missas afro – em memória de artistas ou personalidades do mundo do samba – ou ainda, as festas em terreiros de umbanda e candomblé. O que poucos sabem é que Moisés é metodista e regente do Coral Resistência de Negros Evangélicos, também conhecido por Coral Resistência Negra. Idealizado pela pianista e cantora Nilcéia Netto, para uma apresentação em 13 de maio de 1988, na comemoração do centenário da Abolição, esse coral prosseguiu e hoje se compõe de cristãos de várias denominações religiosas. Além dos ensaios e das apresentações, seus integrantes participam também de debates sobre preconceito racial e exclusão social “além de todas as formas de discriminação enfrentadas, principalmente pelos negros, até mesmo dentro de Igrejas Evangélicas”, afirma Moisés. O repertório do Coral Resistência Negra se compõe de música clássica religiosa, canções folclóricas e populares e também de negro spirituals. “Os sentimentos no canto de trabalho, de dor e de esperança dos negros escravos americanos são similares aos nossos”. Ex-integrante da Força Internacional de Paz da ONU, no Canal do Suez, Moisés da Rocha contata que: “Quase todos os povos que aqui vivem têm suas associações e corais. Só os afro-descendentes causam espanto.” Em suas palestras, aponta como solução das mazelas sociais algo bem simples. “O cumprimento dos mandamentos de Nosso Senhor Jesus Cristo, da Declaração Universal dos Direitos Humanos e das Leis do País, em especial as que garantem a igualdade de oportunidades, tão descarada e hipocritamente desrespeitadas.”

Trecho de reportagem publicada no site da Revista Raça Brasil, sobre fé e negritude: http://racabrasil.uol.com.br/cultura-gente/141/imprime164125.asp


Entrevista com Moisés da Rocha publicada no site da Paróquia da Ssa.Trindade (IEAB):


Coral Resistência de Negros Evangélicos


Coral Resistência de Negros Evangélicos: Símbolo de Luta contra o Preconceito.
Trindade- Como surgiu o Coral Resistência de Negros Evangélicos? Fale também sobre teu papel como Regente.

Moisés da Rocha - O Coral Resistência de Negros Evangélicos, foi idealizado pela pianista e Cantora Nilcéia Netto, para uma apresentação cívico-religiosa, no dia 13 de Maio de 1988, por ocasião da comemoração oficial da libertação dos Escravos no Brasil. Após os ensaios, começamos a discutir o preconceito racial, a exclusão social, enfim as formas de discriminação enfrentadas, principalmente pelos negros, até mesmo dentro das Igrejas Evangélicas, sendo apresentadas, inclusive, várias situações, vários constrangimentos, todos sempre em desacordo com o Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo. Após o referido evento, um grupo com cerca de trinta pessoas, sentiu-se despertado para a necessidade de dar continuidade do exercício, aceitando o desafio de compartilhar com outras pessoas, as nossas preocupações, dores e esperanças de transformação de nossa  sociedade, levando como lema, o combate a todo e qualquer tipo de discriminação. Meu trabalho como Regente, além da condução do Coral, tem a responsabilidade de proferir palestras, estabelecer contatos e divulgar as nossas atividades, no  âmbito nacional e internacional.

Trindade- Qual o repertório musical utilizado pelo Coral?

Moisés da Rocha- Nosso repertório é composto por música sacra tradicional e folclore. A maior parte também é de negro spiritualque caracteriza muito bem o nosso trabalho e nossa mensagem.  Damos destaque para esse último gênero, pois os sentimentos no canto de trabalho, de dor e de esperança dos negros escravos americanos são similares aos nossos. 

Trindade- Algumas pessoas ao verem o nome do Coral intitulado “Negro” acham que está sendo excludente. O que pensa você sobre isso?

Moisés da Rocha- É interessante que essa pergunta por diversas vezes tem sido feita em nossas apresentações, principalmente nos debates-diálogos que promovemos nas comunidades. A gente tem respondido sempre que, este é de negros, como poderia ser de italianos, lituanos, chineses, japoneses etc. O curioso é que quase todas as nações que em grande número de representantes tem um Coral, uma Associação, onde cantam em seu idioma natal, ensinam a língua natal. Quando surge um grupo dos afrodescendentes, há um espanto quase geral. Isto confirma a discriminação e a diferenciação, muitas vezes mal disfarçadas em todos os setores de nossa sociedade. Cantar ópera ou qualquer outro ritmo é normal, mas se tiver algum instrumento de percussão, então é coisa de macumba, do diabo e outras bobagens mais.

     O curioso não é o Coral ser integrado só por negros, mas o questionamento sobre a razão que leva uma pessoa a cantar em um Coral de Negros. A inquietação parece revelar um incômodo com a participação num grupo que manifesta elementos da cultura afrodescendente. Por que será que tal atitude incomoda tanto? Enquanto os negros estavam nas Novas Senzalas, cozinhando e fazendo a limpeza dos templos e salões sociais, lhes era permitido tomar parte no canto coral ou quarteto musical pois eram pretos mas... tinham uma voz... ou eram pretos mas... que mão prá cozinhar!

Trindade- Que contribuições o Coral Resistência de Negros Evangélicos leva para as Igrejas e para a Sociedade?

Moisés da Rocha - A franca discussão da história real dos afrodescendentes: a denúncia de que o preconceito não é privilégio de nenhum grupo, mas é exercido e muito, dentro das Igrejas Evangélicas. Contar que a Igreja sempre foi omissa e na maioria das vezes conivente com a Escravidão e com todos os preconceitos, pois ela faz parte da sociedade e não poderia ser de outra forma. Deveria ser diferente, se a Igreja atentasse de fato para o cumprimento dos mandamentos de Nosso Senhor Jesus Cristo, das Leis do País, da Declaração  Universal dos Direitos Humanos  e para todos os artigos que estabelecem a igualdade de oportunidades na sociedade que são descarada e hipocritamente desrespeitados. 

Trindade- Qual a importância do dia 20 de novembro, “Dia da Consciência Negra”, para a sociedade brasileira?

Moisés da Rocha- Já está se tornando comum a chacota de não negros, que agradecem pelo feriado que nós negros, em nome de Zumbi dos Palmares proporcionamos. Existe até cidades como Osasco, na grande São Paulo, onde vereadores se recusam a estabelecer em lei nesse sentido, alegando que estariam ultrapassando um número de feriados permitidos ao município.  O 20 de novembro tem de continuar sendo, não mais um dia de descanso nesta grande Senzala chamada Brasil. Tem que ser sim, um dia de macro reuniões de todos os setores da sociedade, Dia de Conscientização, de Reflexão e até de Expiação dos Pecados cometidos há tantos anos, principalmente pela hipocrisia. Pode até ser um Dia de Perdão se houver sinceridade de intenções.

Trindade- O que é preciso para participar do Coral Resistência de Negros Evangélicos?

Moisés da Rocha- Para participar do Coral Resistência de Negros Evangélicos, tem que ser afrodescendente,  ter espírito evangelístico de cantor missionário, estar disposto a combater a todo e qualquer tipo de discriminação na sociedade e, de preferência que não tenha experiência Coral. É preciso ter consciência também que o Coral não tem por finalidade promover lucros financeiros e nem preocupação com títulos, doutorados individuais. Cada integrante será apenas mais um componente, sem privilégios, com igualdade de direitos e deveres.    Muita Paz. Axé!!!
Entrevista publicada originalmente em: http://trindade.org/drupal/node/135

Reportagem sobre o programa "O Samba Pede Passagem"http://musica.uol.com.br/ultnot/2006/01/31/ult89u6238.jhtm

Parabenizamos a Diná da Silva Branchini e o Moisés da Rocha por sua atuação constante na valorização da cultura e da negritude, como expressão da fé e da luta por justiça.

Um comentário:

Unknown disse...

Moisés da Rocha é um patrimonio metodista! Muito oportuna e importante esta matéria do Metodista Confessante, que também destaca a importância do Coral Resistência Negra. Este Coral que juntamente com outros movimentos da década de 1980 nascem da participação ativa de metodistas negro/as. Da mesma forma CENACORA - A Comissão Ecumênica Nacional de Combate ao Racismo, que teve o Reverendo Santanta, como seu primeiro Secretário Executivo. Muitos metodistas negros/as de S.Paulo, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul têm construído uma história de resistência além dos muros metodistas. Sinto muito orgulho de Moisés da Rocha, quando aos sábados ou domingos escuto o "Samba pede Passagem".